Renan Calheiros não tem moral para investigar ninguém
O Brasil é mesmo um país surreal, palco de um cinema do absurdo onde o bandido vira mocinho, e o herói se transforma em vilão. Os casos são muitos, mas o mais recente, e muito emblemático, é o do senador Renan Calheiros. Com 43 processos nas costas e respondendo a seis inquéritos no STF, o alagoano está cotado para ser o relator da CPI da Covid.
Por esses motivos, e mais o fato de ser pai de um governador, que pode vir a ser investigado pela CPI, a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) entrou na Justiça para impedir que o senador assuma o cargo. Outro também suspeito, embora na suplência, é Jader Barbalho, pai do governador Helder Barbalho, do Pará, onde não para de aparecer denúncia. A última foi a de respiradores novos escondidos por uma parede falsa.
Sei que é difícil encontrar cândidos parlamentares para compor o colegiado investigativo. A CPI tem como objetivo, cada dia mais claro, de atingir o presidente Bolsonaro. Tanto que, a despeito de uma montanha de indícios de irregularidades no Ceará, os senadores Tasso Jereissati e Cid Gomes se recusaram a apor suas assinaturas no requerimento que incluía governadores e prefeitos na investigação.
O teatro do absurdo que é encenado no Senado tem associação com o STF. Não apenas por este ter obrigado o presidente do Congresso a abrir a CPI, mas porque há uma antologia de teratologias patrocinada pela suprema corte.
Uma pausa para começar o segundo ato. Antes do requerimento da CPI da Covid, já havia o de uma outra CPI, a da Lava Toga, para investigar atos de ministros do STF. Também é regimental a precedência na ordem cronológica. O STF, que furou a fila, vai obrigar a instalação da outra CPI? Afinal, também foram preenchidos todos os requisitos.
E uma curiosidade: estava em andamento uma CPI para investigar ONGs, suspensa por causa da pandemia, mesmo argumento do presidente Rodrigo Pacheco para não instalar de imediato a da Covid.
O STF, já se disse, é um gerador de instabilidade. Deveria ser o contrário. Passou a funcionar como um poder moderador, como se estivesse acima dos demais, o que é completamente contrário ao que está na Constituição. Hipertrofiado, usurpa prerrogativa dos outros poderes sem que ninguém lhe possa contrariar. Abre inquérito por iniciativa própria, impede nomeação de servidores, mitiga o poder da presidência e o transfere com os gestores estaduais e municipais. Uma parafernália jurídica.
Por último, anula condenações, expondo a fragilidade da Justiça brasileira, que por mais de cinco anos, havia decidido o contrário. Torna condenados em injustiçados e está prestes a confirmar que Moro, contra Lula, foi mau como pica-pau. Nem se dão conta de que, ao confirmar que Moro é suspeito, tem que colocar no mesmo balaio de suspeição e incompetência (nos dois sentidos) todos os outros magistrados do TRF, do STJ e até do STF, que convalidaram as decisões da Vara de Curitiba.
Para não terminar em pouca coisa, o cidadão comum tem virado criminoso, na percepção de governadores e prefeitos com seus decretos autoritários, e pela polícia, que o trata como bandido.
Renan Calheiros é muito suspeito e não tem moral para investigar ninguém. Alguém suspeita disso?