A fuga das galinhas

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A CPI mais desastrada da história cometeu mais um ato histórico. Pela primeira vez, um relator deixa de fazer perguntas para um depoente. Houve uma debandada de senadores. Até parecia que alguém gritou “Polícia”, e tudo quanto seria bandido saiu correndo. Mas não havia ali uma operação da PF, que faria tremer metade da composição da CPI, principalmente o relator, campeão de inquéritos (nove, só no STF).

Dois médicos, Francisco Cardoso e Ricardo Zimerman, brandiram argumentos médicos/técnicos em defesa do tratamento precoce, para qualquer doença. Mas o chamado G7, que comanda a comissão, não quer ouvir o outro lado, apenas o lado que ajuda a corroborar suas narrativas. E nem precisa ser médico para entender que uma doença, quanto mais cedo tratada, mais chance de sua cura.

Aliás, todas as políticas públicas que incentivam exames (cânceres, como os de próstata e de mama, são os mais comuns) se baseiam nesse princípio. O tratamento precoce é a melhor terapia. Não apenas o relator, mas também o vice-presidente da CPI, o sempre serelepe Randolph Rodrigues, e os senadores Humberto Costa (PT-PE), o estridente Rogério Carvalho (PT-SE) e até o coronel do cacau, Otto Alencar (PSD-BA), tão valente para enfrentar e massacrar mulheres, correram diante da verdade.

O medo era de ser convencido, como já tinha exposto Omar Aziz (PSD-AM), quando tremeu com a voz suave da dra. Nise Yamaguchi. Quem posava de falcão correu como galinha. O cinema traz apenas o título (Fuga das Galinhas), mas é a mitologia grega que melhor ilustra a situação. Os dois médicos que discorreram sobre os procedimentos no tratamento desta e de outras pandemias seriam “o canto da sereia”. Se ouvisse, Renan iria naufragar o relatório o qual já preparou, mesmo antes da instalação da CPI.

Não temos aqui o épico Ulisses, que se fez amarrar para, mesmo ouvindo o mavioso canto dos maravilhosos seres marinhos, continuar sua caminhada de volta a Ítaca, como bem retratou Homero na sua Odisseia. Temos um animal que se alimenta dos restos que a má política lhe oferece para sair das trevas, tal zumbi, e desempenhar o desprezível papel de algoz de um presidente cujo governo, até agora, não há nenhuma denúncia de corrupção contra ele.

Renan, no melhor estilo “me engana, que eu gosto”, ainda ensaiou um pretexto para fazer um protesto. Na live de quinta-feira, Bolsonaro teria repetido que o fato de ser acometido da doença teria mais eficácia contra uma nova infecção de que vacinas como a Coronavac. Para Renan, um escárnio. Ele tinha a chance de discutir isso com os médicos, mas preferiu o discurso chinfrim.

Bom, a vacina consiste em inocular no seu organismo o vírus inativado para provocar a reação imunológica. Obviamente, se você já foi infectado, já houve a reação. Mas ainda precisa vacinar, principalmente nesta pandemia, por causa das mutações. Embora imprecisa, a afirmação de Bolsonaro não foi uma aberração. Mas Renan está cheio de certezas.

Como disse um dos médicos, numa pandemia, com uma doença nova como a covid, a única certeza é a incerteza. Teimo, porém, numa certeza: não dá para colocar bandidos para investigar. Renan não tem condições de ser relator. Seu maior protesto seria renunciar. Campeão de inquéritos, ainda tem um filho que pode ser investigado. E já agiu em favor do pimpolho quando votou pela não convocação de Carlos Gabas, o executivo que contratou respiradores – e não entregou – para governadores do Nordeste. Entre eles, o Renanzinho.

Eles não querem ouvir Gabas, não querem ouvir médicos a favor do tratamento, está tudo ensaiado. E o pretexto de Renan, a fala do presidente, é só um despiste. Tanto que muitos senadores, Tasso incluso, não compareceram à sessão que poderia trazer muitas luzes sobre a pandemia. Eles não se interessam pela verdade, só a deles.

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