Pacheco não enxerga fundamentação jurídica no pedido de impeachment

02/02/2021 REUTERS/Adriano Machado
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O STF julga os senadores que julgam os ministros do STF, terreno fértil para um conluio, que deságua no pacto da impunidade. Eu não te condeno, tu não me condenas, e todos conseguem a felicidade eterna. Juntos, podemos julgar o presidente. Mas, entre nós, reine a paz. Certamente por isso, nenhum ministro foi impichado nos últimos 125 anos.

Pacheco, que se iguala em sabedoria ao personagem homônimo de Eça de Queiroz, pontificou: não há fundamentação jurídica. Apesar do seu alto conhecimento do Direito, foi humilde ao dizer que se baseava no parecer da Advocacia do Senado. Mesmo recolhido das franjas da vaidade, ele havia antecipado (ou norteado) o parecer no mesmo dia do protocolo do pedido.

Diga-se, en passant, que não cabe à advocacia do Senado entrar no mérito dos pedidos de impeachment, apenas analisar os aspectos formais. Depois disso, o presidente deveria submeter a uma comissão para avaliar sua admissibilidade, rito que, há muito, vem sendo descumprido.

Eu, embora fã do pachequismo, ouso inflar o ego para discordar de tão doutas personalidades, cuja procissão, se arrastando feito cobra pelo chão, passa pelo STF, governadores, ex-ministros da Justiça, a OAB e uma lista de especialistas consultados pela Folha de S. Paulo. Eles não viram fundamentação jurídica. Diante da clareza da lei, grito no escuro: Meninos, eu vi. Juro que vi.

Vi o item 2, do artigo 39, da Lei do Impeachment (1079/1950), que aponta como crime de responsabilidade dos ministros do STF: “Proferir julgamento, quando, por lei, seja suspeito na causa”. Apesar da luminosidade solar, ainda me senti na sombra e me vali do CPC, que fala da suspeição do juiz. Caíram as escamas dos olhos diante do item IV do artigo 145: “Interessado no julgamento do processo em favor de qualquer das partes”.

Juntei no caldeirão os dois trechos da lei mais o inquérito 4781, e se fez a alquimia. Lá, o ministro sinistro é vítima, acusador e julgador. Sendo uma das partes, é inescapável o enquadramento do magistrado. É suspeitíssimo na causa. O inquérito, de uma só lapada, desobedece o princípio da inércia (só age quando provocado), afronta o sistema acusatório (acusador/defensor/juiz) e desconhece o juiz natural (escolha por sorteio).

Julgar em desacordo com a Constituição configura quebra de decoro, outro crime de responsabilidade que pode levar ao impeachment dos togados. Mas quem vai levar isso em conta? Afinal, a Constituição é aquilo que ministros dizem ser. Parece haver um arquipélago de constituições, nas 11 ilhas do STF. O último volume da lei maior, que acumulava poeira nas estantes da corte, foi presenteado por Rosa Weber ao presidente Bolsonaro.

Não precisei, feito o Pacheco de Fradique Mendes, me estender nas fímbrias nebulosas que delimitam a hermenêutica da exegese, para interpretar sofisticados conceitos constitucionais. Eles não viram, mas eu vi. A luz me veio, em mais um lampejo bíblico, não mais no episódio que fez Saulo cair do cavalo. A resposta está em Mateus 11:25.

Por que achei tão claramente a fundamentação jurídica do pedido de impeachment, e todos aqueles sabichões disseram o contrário? Duvidei de mim mesmo desde o início, igual a Descartes. Restou-me, feito Cristo, agradecer ao Pai por ocultar essas coisas aos sábios e entendidos e revelar a mim, diante deles, tão pequenino.

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