Cuidado Com o golpe do Porco Apaixonado nas redes sociais
A vítima é envolvida numa onda de sedução amorosa e financeira, e acaba sem nada.
Quem conta a história é Victor Mesquita (29), que conheceu uma jovem por meio do Twitter. A pessoa enviou uma mensagem direta a ele, no microblog. “Você acha que criptomoedas podem resolver o problema da inflação?”, perguntou a pessoa, ao investidor, nas horas vagas.
O questionamento prendeu a atenção de Mesquita, que gostou da pergunta, e explicou que tipo de investimentos preferia. A pessoa do outro lado gostou da resposta. E também da educação e simpatia do interlocutor, o que a fez pedir seu número de telefone.
Para ele, os dois tinham muito em comum: ele havia deixado sua cidade natal, Salvador (BA), para estudar em Santos (SP); ela abandonou a Coreia do Sul para tentar a vida em Los Angeles. Ele era funcionário de banco. Ela, instrutora de golfe. Ambos moravam sozinhos. Ambos pensavam muito no futuro.
O futuro deles, se Victor havia entendido direito, poderia muito bem ser lado a lado. Adele, como a pessoa se identificava, falava de uma grande vontade de visitar o Brasil, conhecer a cultura e assistir a uma partida de futebol. Seria uma linda história de amor. Mas Adele não estava interessada no coração de Victor. Ela mirava no bolso do rapaz. E quando ele estivesse totalmente apaixonado, ela transformaria todos os investimentos dele em criptomoedas e, depois, levaria tudo embora.
Adele (nome falso) aplicava o Sha Zhu Pan (“abate de porco”, em chinês): uma nova versão dos golpes de romance por meio de redes sociais, que faz vítimas no mundo inteiro. E que, agora, está chegando ao Brasil. Na prática, todos os dias, Adele enviava a Victor imagens de lagostas em restaurantes finos. O Instagram dela estava repleto de stories em clubes caros. Nas conversas de WhatsApp, bolsas e mais bolsas de marca, que ela pedia ajuda para escolher qual comprar.
O modus operandi era o mesmo de outros golpistas do Sha Zhu Pan: as imagens servem para criar intimidade com a vítima e, ao mesmo tempo, ostentar um estilo de vida arrebatador. A jogadora de golfe alegava que tudo isso era possível graças às criptomoedas (dinheiro digital descentralizado, que pode ser transferido online pelo mundo todo), que ela investia em uma suposta bolsa de valores. Os rendimentos assustavam. Adele chegava a tirar até US$ 10 mil em um único dia, relembra Vitor.
“No começo eu achei estranho, mas fazendo algumas contas, dependendo do tempo de investimento, até fazia sentido”, afirmou o rapaz. A impressão era de que Victor havia ganhado na loteria em dobro. Em um acaso do destino, sua vida amorosa e financeira estavam prestes a mudar radicalmente.
O vislumbre de uma vida invejável seduz e atrai muita gente, assim como Vitor, que perdeu tudo o que tinha reservado em criptomoedas. E, segundo o advogado criminal Felipe Moraes, “é tudo muito sedutor porque, todo dia, você vê notícias de alguém que ficou rico da noite para o dia com criptoativos”, explica Moraes, que também é autor do livro Bitcoins e Lavagem de Dinheiro.
A missão do criminoso é convencer a vítima de que ela também pode ganhar muito dinheiro. Ao longo de semanas e, até meses de relacionamento virtual, ele, lentamente, manipula sua confiança para estimular a pessoa a também investir — numa plataforma falsa, de onde ele poderá sacar todo o dinheiro.
É daí que vem o nome do golpe: primeiro, você precisa engordar o porco. Depois, arrancar toda a sua carne. Na prática, a proposta vem de uma pessoa que se apresenta como rica, bem sucedida e emocionalmente interessada na vítima.
Dado o primeiro passo, o golpista apresenta sua ”fórmula do sucesso” e, num processo que pode levar até meses, convence o usuário a fazer o mesmo: comprar criptomoedas e investir numa plataforma de especulação. A plataforma apresenta resultados e incentiva o usuário a gastar ainda mais, chegando ao ponto de tirar todo o seu dinheiro e tudo o que a vítima tem.
Os golpistas levam todo o dinheiro e desaparecem da vida da vítima, que descobre que a plataforma de investimentos é falsa, como ocorreu com Vitor Mesquita. De acordo com o Facebook, foram removidas 1,8 bilhão de contas falsas no mundo todo, entre julho e setembro do ano passado, segundo o último Relatório de Transparência da empresa.
Por meio de nota, a gigante da comunicação, reconhece que, “sabemos que ainda há muito o que fazer, e estamos comprometidos em melhorar. Continuamos a investir em sistemas automatizados, tecnologia de IA (Inteligência Artificial) e revisores de conteúdo para ajudar a resolver essas questões”, afirma.
Em mais uma observação, a empresa diz que, “entre outras dicas de segurança, orientamos as pessoas que não enviem dinheiro ou informações financeiras, mesmo que a pessoa alegue estar em uma situação de emergência. A transferência bancária é como entregar dinheiro vivo. É, praticamente, impossível reverter a transação ou rastreá-la”, adverte.
Agora, para Victor Mesquita e todas as outras vítimas, não adianta muito. Hoje, de perfil fechado e olhos bem abertos, o rapaz segue desconfiando do amor online. Afinal, ele não sabe se do outro lado está alguém que quer começar uma história de amor inusitada, ou um falsário em busca de seu dinheiro.