Deu a louca na Justiça

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Não demoraria muito, e as atitudes arbitrárias promovidas pelo ministro Alexandre de Moraes iriam se espalhar. Quando não se tem o menor escrúpulo de afrontar a Constituição para atingir inimigos, quando a Justiça vira objeto de vingança pessoal, dá-se a erosão do arcabouço jurídico, corroendo por contágio as demais instâncias. Magistrados que se acham deus, e outros que têm certeza de sua condição divina, não ficariam restritos às quatro linhas legais. Isso é coisa para súditos, para reles mortais. A Justiça brasileira está sendo carcomida em seus intestinos pelo perigoso vírus da arbitrariedade, cujos principais sintomas são o abuso de autoridade, alimentado pela firme crença da impunidade.

O leque de ilegalidades de Moraes já tinha, em menor ou maior grau, chegado à maioria das estrelas togadas que compõem a constelação do STF. Elegeram Bolsonaro como inimigo número 1 da democracia, um mal que deve ser combatido a todo custo, até ao custo do autoritarismo judicial. Atos ditatoriais a pretexto de salvaguardar a democracia. Faz lembrar o “prendo e arrebento” de Figueiredo quando preconizava a abertura política.

Exemplo reluzente de que a deterioração chega rapidamente à base foi a prisão preventiva decretada por Renato Borelli, juiz de primeira instância do Distrito Federal, que não se deu ao trabalho de fundamentar a prisão de oito pessoas, incluindo o ex-ministro Milton Ribeiro. Foi tão absurda que causou estranheza a gregos e troianos. No dia seguinte, todos já estavam soltos por ordem do desembargador que chamou a prisão de despicienda.

Não se viu nenhum dos requisitos à preventiva, elencados nos artigos 312 e 313 do CPP. Por outro lado, alas do Polícia Federal estão carentes das ações espataculosas inauguradas na Lava Jato. O delegado da PF pediu a prisão, que não contou com o aval do Ministério Público. O MP sugeriu medidas alternativas. O juiz, também na ânsia por holofote, não contou pipoca. Deixou de lado a argumentação do MP. Decretou prisão a granel.

Fez mais. Queria, além da prisão, o constrangimento. Consciente da fragilidade de sua fundamentação, sabia que logo a prisão seria revertida. Por isso, determinou imediata transferência dos presos para Brasília. Só não aconteceu por problema de logística. A PF, que só soube da operação pouco antes de sua execução, não teve como dispor da aeronave para transportar o troféu do juiz.

O delegado que conduzia o caso se abespinhou, reclamando falta de autonomia, sem condição de continuar o trabalho. Única e exclusivamente por perder a chance de aparecer nas primeiras páginas de jornais e telas de TV escoltando os presos para audiência de custódia, procedimento que é para garantir direitos do preso, não para puni-lo. E mais uma investigação se abre para apurar interferência indevida.

Deu a louca na Justiça. Já não vale o ato, ou o crime em si, mas quem o comete. Nunca um presidente da República respondeu a tantos inquéritos, jamais se investigou tanto um chefe do Executivo em pleno mandato. A perseguição não é apenas ao politico, estende-se a seus seguidores, que tem seus canais bloqueados e desmonetizados, quando não presos, sem sequer saber o motivo da prisão.

O primeiro habeas corpus impetrado pela defesa de Milton Ribeiro foi negado. E vejam só. A negação não se deu em função do mérito, mas por falta do mandado de prisão, ao qual a defesa não teve acesso. É muito absurdo. Ah, despiciendo significa digno de desprezo, desprezível.

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