Região da Amazônia tem as cidades mais violentas do país
Dados inéditos do Anuário mostram crescimento de facções e de crimes ambientais em área vital para o crime organizado no Brasil.
A região da Amazônia Legal tem 13 dos 30 municípios mais violentos do Brasil. São cidades pequenas e rurais, que proporcionalmente registram até nove vezes mais mortes violentas intencionais do que a média nacional. Os dados inéditos constam na 16ª edição do Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, divulgados nesta terça-feira (28).
As informações, coletadas com as secretarias de Segurança Pública dos estados, foram analisadas a partir das médias anuais de assassinatos no período entre 2019 e 2021. Os pesquisadores consideram como “mortes violentas intencionais” todas as ocorrências registradas de homicídios, latrocínios, lesões corporais seguidas de morte, feminicídios, homicídios de policiais e mortes por intervenções policiais.
O município de São João do Jaguaribe, no Ceará, com 224 mortes violentas a cada 100 mil habitantes, ocupa o primeiro lugar entre as mais violentas do país. Entre os 30 municípios mais violentos não há nenhum das regiões Sul e Sudeste (veja o ranking abaixo).
Entre as cidades mais violentas do país está Jacareacanga, no Pará, que ocupa o segundo lugar do ranking, com 199,2 mortes violentas intencionais a cada 100 mil habitantes. Também na Amazônia Legal, Santa Luzia D’Oeste e São Felipe D’Oeste, em Rondônia, ocupam o quarto e quinto lugar respectivamente.
A taxa desproporcional de mortes nessas cidades da Amazônia Legal alerta os autores por ser um reflexo do crescimento de diversas categorias do crime organizado: o tráfico de drogas, o desmatamento e o garimpo. Mesmo ao considerar toda a região, que ocupa quase 60% do território brasileiro, a média de casos é de 30,9 — 38% maior do que a nacional, de 22,4.
“O que tem acontecido recentemente é uma intensificação da sobreposição dos crimes ambientais que já ocorriam na região, com outras modalidades criminosas mais organizadas. Essa sobreposição tem provocado o crescimento da violência nesses municípíos com característica rural ou florestal”, explica o sociólogo David Marques, um dos coordenadores do Anuário.
Marques também aponta os conflitos fundiários como um dos grandes responsáveis pelo problema e cita que 77% das 403 mortes envolvendo disputa de terras no Brasil aconteceram na região da Amazônia Legal nos últimos dez anos, segundo a Comissão Pastoral da Terra.
“É uma região na qual ainda perdura um certo caos fundiário. Tem uma grande proporção de terras que são da União, áreas de preservação especial, como unidades de conservação, ou terras indígenas e quilombolas. E tem uma grande proporção de terras ainda em destinação. É uma área geograficamente muito grande, com uma capacidade de fiscalização muito baixa por parte do poder público.”
A Amazônia Legal também engloba importantes disputas do tráfico de drogas pelas principais rotas nacionais e internacionais de transporte das substâncias. De acordo com o Anuário, 20 facções criminosas regionais e as duas maiores do país (Primeiro Comando da Capital e Comando Vermelho) estão em conflito na área. Reportagem especial da Record TV apontou que o Amapá, estado mais violento do Brasil de acordo com o estudo, é o único onde facções locais disputam o controle em pé de igualdade com o PCC e o CV.
Para especialistas, os resultados do estudo indicam uma tendência geral da “interiorização” da violência no Brasil, que tem se acentuado nas últimas décadas, e a mudança do centro do problema do Sudeste para as regiões Norte e Nordeste.
Essa migração entre as regiões acompanhou a dinâmica das facções criminosas, como ocorre agora na Amazônia Legal. Há 30 anos, a violência escalava a partir do nascimento e estabelecimento do Comando Vermelho e do PCC como os grupos dominantes nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo, respectivamente.
“As regiões Norte e Nordeste são mais violentas do que o resto do país, com exceção talvez do Rio de Janeiro, como cidade grande. Mas têm [mais violência] sim, infelizmente, porque tem um predomínio muito forte de facções criminosas nesses lugares”, explica outro autor do Anuário, o pesquisador Rafael Alcadipani.
Além da atuação desses grupos, a diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, cita diversos fatores que fizeram as mortes diminuírem no Sudeste: novas políticas públicas de gestão dos resultados, reformas das estruturas policiais, investimentos federais, o investimento estadual em delegacias com capacidade de esclarecer homicídios e a retirada de armas de circulação.
Apesar da piora da violência nas cidades menores, o cenário nacional tem melhoras a curto prazo. O número de mortes violentas no Brasil caiu de 50.448 ocorrências em 2020 para 47.503 no ano seguinte. Com a redução, a taxa se aproximou do melhor ano da série histórica do Anuário, que foi 2011, com 47.215 assassinatos.
Fonte: PortalR7.COM