Com carga tributária recorde, Bolsonaro usa corte de impostos como trunfo eleitoral
Presidente e seus filhos tem reforçado divulgação de desonerações e atacam Lula por oposição a ICMS menor.
Em um cenário econômico difícil para a reeleição do presidente Jair Bolsonaro devido à inflação alta e ao aumento da pobreza, a divulgação de cortes de tributos virou uma de suas principais bandeiras para tentar recuperar a vantagem que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) abriu na disputa, hoje o petista lidera as pesquisas de intenção de voto.
Mas, embora Bolsonaro e seus filhos tenham intensificado a divulgação das desonerações promovidas pelo governo, a arrecadação de impostos vem batendo recordes. E, ao menos por enquanto, o presidente não conseguiu cumprir sua promessa de redução da carga tributária (relação entre o que é arrecadado e a riqueza gerada no país), a União arrecadou no ano passado o equivalente a 22,48% do PIB, maior patamar desde 2013 (veja mais abaixo).
“Já viu impostômetro negativo?”, twitou, por exemplo, o deputado federal Eduardo Bolsonaro no dia 13 de julho, ao compartilhar um vídeo que lista reduções de impostos promovidas pelo governo do seu pai, entre elas, a desoneração de produtos industrializados, combustíveis e de itens da cesta básica.
O “impostômetro” citado pelo deputado é uma referência ao painel que exibe uma projeção da arrecadação dos governos em tempo real no centro da capital paulista, mantido pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP) desde 2005. Segundo esse levantamento, a soma da arrecadação de União, Estados e municípios nesta ano atingiu R$ 1,5 trilhão em 11 julho, dois dias antes do post de Eduardo Bolsonaro. Foi a primeira vez que esse patamar foi alcançado antes de agosto.
Os dados oficiais da Receita Federal confirmam a tendência de alta no recolhimento de impostos pelo governo federal. Após o valor recorde registrado em 2021 (R$ 1,878 trilhão), a arrecadação da União somou R$ 908,5 bilhões de janeiro a maio de 2022, maior resultado da série histórica iniciada em 1995.
Já a carga tributária, indicador que mede o peso dos impostos da economia também subiu no ano passado, mostrando que o crescimento da arrecadação veio acima da expansão do Produto Interno Bruto (PIB, ou soma de bens e serviços). A alta foi puxada tanto pelo governo federal, como por Estados e municípios.
Considerando apenas a carga tributária da União, o indicador ficou em 22,48% do PIB. Isso significa que o governo federal recolheu em impostos o equivalente a mais de um quinto da riqueza gerada no país no ano passado.
A carga tributária total (que inclui a arrecadação de Estados e municípios) chegou a 33,9%, maior patamar desde 2010, quando começa a série calculada pelo Tesouro Nacional. Isso representa cerca de um terço do PIB.
A redução da carga tributária era uma das principais promessas do presidente na campanha de 2018: “Nossa equipe econômica trabalha para redução de carga tributária, desburocratização e desregulamentações. Chega de impostos é o nosso lema! Somos e faremos diferente. Esse é o Brasil que queremos!”, dizia Bolsonaro, em setembro daquele ano.
O governo agora corre para baixar impostos nos meses finais do governo. “Quando nós vimos que a arrecadação saiu de 31% do PIB para 33% do PIB, (decidimos que) está na hora de reduzir impostos, porque queremos voltar para os 31%. Então vamos reduzir impostos, daqui até o fim do ano vamos ficar reduzindo impostos”, afirmou o ministro da Economia, Paulo Guedes, em abril.
Essencialmente, quando um governo promove desonerações, está reduzindo a carga tributária, para incentivar a atividade econômica, com consequente renúncia da arrecadação (ou seja, recolhe menos impostos).
Mas não é isso que está acontecendo; afinal, a arrecadação vem aumentando.
É importante ressaltar que parte dos cortes anunciados por Bolsonaro é recente e, por isso, não tiveram ainda impacto relevante na arrecadação. É o caso redução de 35% da alíquota do IPI (Impostos sobre Produtos Industrializados), adotada em abril, e da redução a zero de alguns impostos federais sobre gás, diesel, biodiesel, etanol e gasolina, medidas que juntas devem reduzir a arrecadação em R$ 41,5 bilhões neste ano, segundo cálculo da Instituição Fiscal Independente (IFI).
Outro corte novo é a limitação das alíquotas estaduais do ICMS cobrado sobre combustíveis, energia, telecomunicações, gás e transporte urbano, a medida foi aprovada em junho pelo Congresso após pressão de Bolsonaro e deve representar uma perda anual para governos estaduais e prefeituras de cerca de R$ 91,6 bilhões, segundo estimativa da Confederação Nacional dos Municípios.
Esses cortes adotados no final do governo inclusive têm gerado críticas de que essas desonerações seriam eleitoreiras. “É normal zerar imposto em ano de eleição?”, perguntou a Bolsonaro no Twitter o perfil Favelado Investidor em maio desse ano.
O presidente, porém, responde a esse tipo de crítica sustentado que a redução vem desde o início do seu governo. Nesse caso, ele listou uma série de produtos que foram desonerados a partir de 2019, como remédios contra câncer e HIV/aids, jogos eletrônicos, instrumentos musicais, skates, absorventes e fraldas.
Mais do que esses cortes localizados, porém, o que tem ditado o fluxo da arrecadação é o desempenho da economia e da variação dos preços, explicam especialistas ouvidos pela BBC News Brasil. Em 2020, segundo ano do governo Bolsonaro, houve queda significativa do recolhimento de impostos devido à retração do PIB, provocada pela pandemia de coronavírus. Naquele ano, a carga tributária total (31,7%) e federal (20,95%) foram as menores da série histórica do Tesouro Nacional (iniciada em 2010).
Fonte: BBCNews