O teatro da carta

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Mesmo com expertise da teledramaturgia, a Rede Globo não conseguiu emocionar os brasileiros com a tal da carta da democracia. Os signatários se vestiram a caráter, uns realmente acreditando num papel histórico que estariam exercendo. Mas a maioria era composta de histriônicos, aproveitando o espaço midiático para, ao mesmo tempo, tentar desestabilizar o adversário político. Nenhum dos dois segmentos acredita mesmo que a democracia estava sob risco, muito menos os supostos destinatários. O povo mesmo deu de ombros ao grande esforço de comunicação do consórcio de imprensa e da oposição. Passaram ao largo do grande teatro encenado nas faculdades de Direito.

MELANCÓLICO – A dinâmica que a Globo imprimiu na cobertura jornalística, com passagens de repórter ao vivo, entremeadas com cenas editadas, não foi suficiente para evitar o clima de velório. Até a citação de Coração de Estudantes, entoada por Milton Nascimento, para ecoar a lembrança da histórica Diretas Já, serviu para evocar o cortejo fúnebre de Tancredo Neves. Os jovens de então são hoje sexagenários.

MANCHETES – Os três jornalões cumpriram seu papel no dia seguinte. As capas de O Globo, O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo reservaram 80% de seu espaço para o assunto, que tomou de conta do noticiário interno, com editoriais e, pelo menos, seis páginas em cada um dos paquidermes da imprensa brasileira. Não era jornalismo, era militância não disfarçada. Mesmo o Estadão, que ainda se esforça pelo jornalismo, caiu na gandaia.

FIASCO – O objetivo, se ainda encoberto, foi revelado na GloboNews, ao tratar do impacto eleitoral da carta pela democracia. Eliane Catanhede, que também escreve no Estadão, exibiu os números de uma empresa de monitoramento das redes. Bolsonaro teve 360 mil interações em seus comentários sobre a carta, Lula registrou apenas 6 mil, um pouco mais de 1% do desempenho de seu principal adversário.

FALSIFICAÇÃO – O movimento, que mobilizou a moçada acima dos 60 anos, levou cerca de um ano para sua mobilização. Segundo os organizadores, houve em torno de um milhão de subscritores do documento. E com um pequeno escândalo: a inclusão indevida do nome de Paulo Skaf. O ex-presidente da Fiesp acionou a polícia para investigar a falsificação. Já outro documento, sem apoio da grande mídia, em favor da liberdade expressão, superou a carta em número de apoiadores.

CARTINHA – Pela repercussão da carta, gigante nas mídias, mas anã entre os eleitores, estava certo Bolsonaro em chamá-la pelo diminutivo. Grandiosa foi a tentativa de construir a narrativa de que o chefe do executivo trama um golpe e demonstra desapreço pelo regime democrático. O resultado foi pífio. Sem citar um único ato de governo que colabore a versão golpista, a cartinha só circulou na bolha dos que perderam o tato, o contato com a realidade. Eles só pensam naquilo.

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