Quando o juiz quer aparecer mais que o jogador
Sobressaia o talento do jogador numa partida de futebol. As jogadas ensaiadas, o esquema tático, o drible desconcertante, o talento individual, tudo isso são recursos para engrandecer o espetáculo que leva multidões às arenas esportivas que se entregam às catarses coletivas. O problema é quando o juiz, cuja missão é fazer fluir o espetáculo, trunca o jogo, inverte punições, e claramente descumpre as regras. Mesmo o VAR tem sido motivo de polêmica, que dá uma pitada de sabor ao esporte. Mas quando erra a mão, quando o árbitro quer aparecer mais que o jogador, o espetáculo se apresenta como seu inverso, trazendo violência, dentro e fora do campo, e até no entorno dos estádios. Tem a ver com a Justiça?
A partida de futebol serve de alegoria para nossas cortes superiores. Nesta terça-feira (16/8), toma posse na presidência do Tribunal Superior Eleitoral o mais polêmico dos ministros do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes. Polêmico deveria ser o segundo pior qualitativo para um magistrado. Pior mesmo é o parcial, que chega a invalidar sentenças, como no caso de Sérgio Moro, tanto polêmico quanto parcial.
Estamos diante de uma eleição que se pronuncia a mais aguerrida e mais polarizada de todo o período de redemocratização. O mais estranho dos inquéritos, parido dentro da corte, com escolha a dedo do relator, foi tido pelo então ministro decano, Marco Aurélio de Mello, como inquérito do fim do mundo. Chamou de natimorto, pois eivado de ilegalidade. Moraes, então mais inexperiente dos togados, assumiu a relatoria, num desenrolar crescente de autoritarismo.
É costume dizer que quando a política entra pela porta da frente dos tribunais, a Justiça se esgueira pela porta dos fundos, sai de fininho. Se à mulher de César se exige o ser e parecer da honestidade, o mesmo poderia se falar em relação aos juízes. É enorme a aparência de jogada política nas decisões judiciais. De repente, as condenações deixam de existir. As delações perdem efeito, e a grana devolvida foi só um erro contábil. A ficha suja é lavada a jato.
Tanto Fachin, que invalidou as ações de Moro sobre Lula, quanto Alexandre de Moraes, além de Barroso, já trocaram farpas com o presidente Bolsonaro. Até aí, seria apenas descortesia entre as mais altas autoridades, que deixaram de lado a tal da liturgia do cargo. Quando o chefe do executivo é também um candidato, fica parecido que aqueles que digladiaram verbalmente com o mandatário seriam suspeitos para julgar suas ações.
Moraes, que já foi chamado de canalha por Bolsonaro, que ameaçou não acatar suas decisões, vai presidir as eleições. Terá equilíbrio suficiente para julgar com imparcialidade, não teria risco de se deixar levar por sentimento de vingança? Moraes já ameaçou cassar e prender candidato que duvidar das urnas. Desembargador do TRE carioca faz a mesma ameaça também aos eleitores. Se o jogador reclamar do juiz, pode ser expulso. Agora, querem expulsar também a torcida.