Deu a louca no Judiciário

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Vamos combinar assim: a Constituição está suspensa até o encerramento das eleições. De preferência com a derrota de Bolsonaro. Parece ter sido esse o exíguo pacto das catacumbas judiciárias, tendo em vista as recentes aberrações jurídicas. A escalada autoritária é típica de regimes tirânicos, dando vazão a todas as burlas, desde que se afaste o risco da derrocada da democracia, encarnado pelo mal maior, o Messias.

Censura, prévia ou póstuma, prisões arbitrárias, atos administrativos que subvertem a hierarquia constitucional, inquéritos infindáveis, afronta ao processo acusatório, descondenações. O vasto arsenal de ilegalidades, abrigado no paiol do STF e anexos, é típico das ditaduras. Estamos em pleno estado de sítio, sem o decreto presidencial nem a aprovação do Congresso. Um único poder se arvora em moderador, usurpa as prerrogativas dos demais e se coloca acima até da Constituição.

Sob o manto da legislação eleitoral, os togados exageram na dose. O ministro Benedito Gonçalves, aquele que recebeu na cara tapinhas amistosas de Lula, resolveu aloprar. Proibiu o lançamento do documentário “Quem mandou matar Jair?”, sem sequer saber do seu conteúdo. No regime militar, pelo menos, o censor avaliava e decidia o que iria, ou não, ser veiculado. Agora, a decisão se dá sem qualquer avaliação. É o repique do filme Minority Report, quando a Polícia prendia o ex-futuro criminoso, antes que ele cometesse o delito.

Não temos aqui o talento de Steven Spielberg, tampouco a estrela de Tom Cruise, são seres sombrios, de capas pretas, imbuídos da convicção de estar fazendo o bem, atuando contra o Inimigo do Povo, para lembrar o teatro de Ibsen. Um médico alerta sobre a poluição de um balneário, principal fonte de renda da cidade. E todos se voltam contra ele. É uma metáfora da sujeira estrutural da sociedade, na política, na imprensa, na Justiça, em que ninguém quer saber a verdade. Já ir por aqui é insistir na citação bíblica de João 8:32 ( A verdade vos libertará).

O TSE inaugurou as palavras anátemas em nosso arcabouço jurídico. Ladrão, corrupto, descondenado, ex-presidiário são verbetes do Index Prohibitorum, que remonta aos tempos medievais da Igreja Católica. Os profissionais da Jovem Pan estão impedidos de pronunciá-las. Talvez por desuso, esqueceram de incluir “triplex” e “Atibaia”. Contra esse absurdo, valho-me de um pensamento libertário: “A censura é a mordaça da liberdade. Quem gosta de mordaça, é tirano. Quem gosta de censura, é ditador” (LÚCIA, Carmen).

Mais de uma vez, a ministra Carmen Lúcia, levada ao STF pelos braços de Lula, pronunciou-se contra a censura. Numa da últimas investidas, anunciou a morte do “Cala a Boca”. No entanto, concordou com a censura imposta à Jovem Pan. Num voto deplorável, reconheceu que a Constituição garante a liberdade de expressão e de imprensa, que há uma súmula vinculante expedida pelo STF expressamente contra a censura, mas sucumbiu ao pendor tirânico, ditatorial, e ajudou a amordaçar a imprensa.

Seu voto revolveu os instintos mais primitivos de Roberto Jefferson que a execrou pelas redes sociais, em analogias nada elogiosas, atingindo a honra da ministra mulher. Foi tão asqueroso no ataque quanto imprudente na resposta aos policiais que o foram prender. Contra a ministra, linguagem de baixo calão. Contra a PF, a linguagem do canhão. É certo que ninguém é preso por ofensas. Nas duas vezes, porém, prenderam-no após ofensas. É como se fosse uma vingança. E a Justiça foi emprenhada para, justamente, evitar a vendeta.

Roberto Jefferson está no fim de linha, é um cadáver político a quem ainda não enviaram o atestado de óbito. É também um homem de saúde frágil, acometido de doenças que fizeram os médicos desenganá-lo a partir de 2017. Está em sobrevida. E ainda é injustiçado, preso sem condenação ou culpa formada, já cumpriu pena maior do que se tivesse sido condenado. Conhecedor dos direitos, tem a exata noção das ilegalidades. Também sabia que era errado seguir o desiderato expresso por Ciro Gomes: receber a PF na bala.

Garantiu que cairia de pé para, logo depois, tombar diante da serenidade. Seu ato era suicídio, tanto político como físico. Só sairia morto. Atirou contra os policiais, “sem o intento de matá-los”, explodiu granadas cujos estilhaços atingiram de raspão os policiais e em cheio seus aliados políticos. Atirou para todos os lados. Lula, que já teve Jefferson no bolso, correu para fazer exploração política do caso. Depois do surto, Jefferson está preso à espera de um indulto. Deu o que tinha de dar.

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