Policial agredida em curso da PM diz que foi pressionada a retornar a treinamento
Desde o dia 8 de junho, a policial feminina maranhense que denuncia ter sido agredida por um instrutor da Polícia Militar de Tocantins – o cabo Rafael Ferreira Martins – durante curso tático no Ceará, lida com os traumas físicos e psicológicos da situação.
Ela detalhou como foi recebida pela corporação após o caso. Segundo a vítima, houve várias tentativas de que ela voltasse ao curso e um convite para passear na Praia de Iracema, ponto turístico de Fortaleza.
As conversas com a coordenadora da formação, Capitã Maria Freitas, e com o diretor, ainda não identificado, foram relembradas pela agente:
“Desci do alojamento, ela estava com uma psicóloga (a vítima não tem certeza se era uma psicóloga) e conversou comigo. Disse que tinha afastado o policial e que tinha ido me resgatar. Eu disse que não ia, que não tinha condições psicológicas para voltar e ela perguntou se eu queria que fizessem mais alguma coisa com ele. Eu disse que não, que não importa o que vocês vão fazer com ele, eu já saí do curso. Quero tratar o que ele causou em mim. O que vocês vão fazer com ele não é problema meu”, relatou.
Em nota, a Secretaria da Segurança Pública do Ceará (SSPDS), disse que desde que tomou conhecimento do caso, colocou todo o aparato das instituições disponíveis e trata o caso com seriedade.
“A SSPDS ressalta que um inquérito policial para apurar o fato foi instaurado na Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), onde foram realizadas oitivas e a vítima recebeu todo acolhimento, além de ser encaminhada para a realização de exame de corpo de delito. Cabe destacar que o inquérito policial corre em segredo de Justiça, desta forma, detalhes da investigação em andamento não podem ser revelados”.
Ainda na resposta, a pasta reforçou que a Controladoria Geral de Disciplina (CGD) dos Órgãos de Segurança Pública determinou imediata instauração de procedimento disciplinar para devida apuração na seara administrativa disciplinar.
“Por fim, a SSPDS frisa que não compactua com tais condutas e salienta que todas as denúncias apresentadas passam por investigação preliminar no intuito de que indícios de autoria e materialidade sejam colhidos para dar subsídios ao oferecimento de instrução processual e adoção de medidas cabíveis na esfera criminal”.
Insistência para que ela retornasse ao curso
Ainda conforme a policial, a coordenadora do curso insistiu mais de quatro vezes para que ela retornasse ao curso e comentou, em certa conversa, que o caso poderia “respingar” nela.
Em outro momento, a capitã Maria Freitas levou o diretor do curso para conversar com a agente que denuncia ter sido agredida. Segundo ela, o diretor parecia não ter sido avisado sobre o caso, tanto que fez um convite inusitado:
“Ele perguntou se eu queria companhia, se eu queria ir para a Praia de Iracema, se eu queria botar um biquíni. Disse que iam me deixar e me buscar. Eu disse: ‘Diretor, estou com as nádegas roxas’ e ele respondeu ‘Mas foi do curso, não foi?’. Eu disse que não. Ele falou com ela (a capitã): ‘Você está sabendo disso?’. Eu disse para ela: ‘A senhora não falou para ele?’. Ela ficou enrolada”, detalhou.
Depois desse episódio, a coordenadora retornou o contato com a policial avisando que o diretor havia perguntando o que ela iria fazer. “Eu disse: Não sei, estou muito perturbada, muito confusa. Não sei o que vou fazer, mas com certeza vou fazer alguma coisa. Não posso deixar dessa forma”, respondeu.
Entenda o caso
A Secretaria da Segurança do Ceará abriu uma investigação para apurar a agressão a policiais femininas durante um curso tático da Polícia Militar. Segundo a vítima, o agente usou uma ripa de madeira para agredir agentes nas nádegas.
O curso de quatro semanas foi promovido pela Secretaria de Segurança do Ceará para treinamento de mulheres militares de Pernambuco, Maranhão, Paraná, Rio Grande do Norte e Piauí. A proposta do curso era de treinamento em defesa pessoal, de técnicas operacionais policiais, de salvamento, entre outros procedimentos. As aulas foram ministradas por PMs do Tocantins.
A vítima, que é do Maranhão, conta que no oitavo dia de aula, o instrutor Rafael alegou que um pedaço de sua pizza havia sumido e, por isso, puniu as mulheres com uma ripa de madeira.
“Estava em outra parte quando vi aquele cara louco falando ‘Roubaram minha pizza’, ‘São loucas’. Ele colocou todo mundo em posição de flexão e desceu a paulada em todas, na bunda. Tinha 22 comigo”, disse a policial em entrevista.
O que se sabe, até agora, é que o PM Rafael Ferreira Martins está sendo investigado, mas não foi afastado de seu cargo em Tocantins.
A Polícia Militar do Tocantins informou que lamenta o caso e que pediu os detalhes do caso para a investigação.
“Pelo menos eu estou incomodando, mostrei o que aconteceu. Ele vai ter que se explicar muito. Eu não sei o final disso, mas pelo menos eu estou fazendo a minha parte”, concluiu a denunciante.