Cearenses têm R$ 21,2 milhões de dívidas em atraso com cartão de crédito e consignado
No Nordeste, o valor chega a R$ 25 bilhões, segundo estudo da FGV/Ibre com dados do Banco Central.
A falta de educação financeira, somada às diversas crises econômicas e às taxas de juros exorbitantes, tem deixado a população nordestina e cearense em uma situação delicada com o próprio orçamento.
Somente com consignado e cartão de crédito, as duas modalidades de crédito mais utilizadas na Região, havia R$ 129 milhões de dívidas inadimplentes em abril deste ano. No Ceará, esse valor é de R$ 21,2 milhões, dos quais R$ 3,1 milhões são de consignado e R$ 18,1 milhões, de cartão de crédito.
O Estado só fica atrás de Pernambuco (R$ 27,7 milhões) e da Bahia (R$ 37,9 milhões) em volume de dívidas inadimplentes dessas duas modalidades. Os dados são do Banco Central, com organização do pesquisador associado da FGV/Ibre, Genaro Lins.
Confira o Ranking Completo do Nordeste:
Bahia R$ 37,9 milhões
Pernambuco R$ 27,7 milhões
Ceará R$ 21,2 milhões
Maranhão R$ 11,2 milhões
Rio Grande do Norte R$ 10,5 milhões
Alagoas R$ 8,9 milhões
Piauí R$ 5,7 milhões
Sergipe R$ 5,5 milhões
O levantamento desenha um panorama do crédito no Nordeste, com foco no consignado e no cartão, que se apresentam como as modalidades mais acessadas, a primeira representando 27% de toda a carteira da Região, enquanto o cartão responde por 20%.
Quando se olha para a inadimplência, a tendência se inverte: o cartão é responsável por 43% e o consignado por apenas 9%.
Na visão geral, nós temos um produto muito saudável, que é o consignado, e temos um produto muito complicado em termos de inadimplência, que é o cartão de crédito. De todo o crédito do Nordeste, 5,2% estão inadimplentes. Se a gente separa créditos sem garantia e com garantia, tem uma diferença grande. Sem garantia, 10,7% estão inadimplidos. Com garantia, só 2,5% estão inadimplidos”.
Pesquisador associado do FGV IBRE
O pesquisador aponta que um agravante é o fato da população nordestina de baixa renda, que ganha até dois salários mínimos, ter 23% do crédito concentrado no cartão.
Isso porque, ainda conforme o levantamento, os juros rotativos do cartão podem chegar a 445% ao ano. Nessa faixa de renda, o consignado representa 35% do crédito.
Entre a população de média renda (entre dois e cinco salários mínimos), o consignado cai para 28% e o cartão fica estável, em 24%. Em compensação, o financiamento de veículos cresce de 5% para 12%.
Já na alta renda (acima de cinco salários mínimos), o uso do cartão cai para 18% do crédito utilizado. O consignado fica em 21% e outras linhas como crédito relacionados ao agronegócio (16%) e o empréstimo pessoal (7%) aparecem com mais força.
“São produtos com estrutura de crédito muito diferentes, estrutura de risco diferente. Isso significa preços diferentes, significa cobrança diferente e bem-estar da população diferente. A questão principal é como a gente consegue chegar e ver como esses produtos se adéquam a cada uma dessas populações: baixa, média e alta renda”, pontua Lins.
70% DOS USUÁRIOS DE CARTÃO SÃO INFORMAIS
Um segundo ponto de atenção nos dados coletados é que 70% das pessoas de baixa renda que utilizam cartão de crédito são informais, que não possuem registro de uma profissão. À medida que a faixa de renda sobe, a participação desse grupo vai reduzindo, para 38% na média renda e para 20% na alta renda.
A tendência é semelhante quando avalia a carteira do consignado: 77% dos nordestinos adeptos dessa modalidade são outros na baixa renda, 14% na média renda, e 6% na alta renda.
Diferente do cartão, o consignado possui juros mais acessíveis. As taxas praticadas em abril chegavam a 40% ao ano.
“Você tem que migrar o consumo de cartão de crédito na baixa renda para produtos mais garantidos. Você tem que desenhar produtos mais garantidos para consumo dessa população, tais como o microcrédito”, avalia o pesquisador.
João Mário França, professor do Programa de Pós-Graduação em Economia (Caen) da Universidade Federal do Ceará (UFC), reitera a diferença quando um crédito é com garantia e o crédito sem garantia.
No caso de imóveis e no próprio consignado, a inadimplência é muito baixa porque é um crédito vinculado a algum tipo de garantia. Além da questão da educação financeira, o Governo também precisa pensar em algum tipo de política pública de criar instrumentos para os mais pobres com garantia, além dos que já existem. O uso indevido do cartão de crédito com essas taxas muito altas torna a dívida uma bola de neve e chega a um patamar que ele não consegue mais pagar”.
Fonte: Diário do Nordeste