Incra assegura na Justiça permanência de famílias quilombolas em território no MA
A decisão foi tomada a partir de demanda judicial do Incra que solicitou a antecipação de tutela no âmbito de ação de reintegração.
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), em Brasília, garantiu o direito de permanência de 136 remanescentes de quilombos nas terras da comunidade Boa Hora III/Marmorana, em Alto Alegre do Maranhão (MA), distante cerca de 200 quilômetros ao Sul da capital, São Luís. O direito será resguardado até a emissão do título definitivo da área.
“Esse reconhecimento da posse dos quilombolas sobre o território tradicional é paradigmática, pois traz um posicionamento jurídico que dialoga com a Constituição e tratados internacionais de direitos humanos”, ressalta a diretora da Câmara de Conciliação Agrária do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Maira Coraci Diniz.
A decisão foi tomada a partir de demanda judicial do Incra que solicitou a antecipação de tutela no âmbito de ação de reintegração/manutenção da posse movida pela Associação dos Produtores e Produtores Rurais dos Povoados Marmorana e Boa Hora III. Eles denunciam a invasão das terras da comunidade por proprietários rurais que alegam serem os legítimos donos.
O território abrange 700 hectares. O processo de regularização tramita no Incra e, atualmente, está em uma das fases mais complexas do caminho para a titulação: a elaboração do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID). Ele engloba aspectos antropológicos, etnográficos, históricos, cartográficos, fundiários, agronômicos, socioeconômicos e ambientais, obtidas em campo, com os quilombolas, e junto a instituições públicas e privadas.
No caso de Boa Hora III/Marmorana, o Laudo Antropológico já foi concluído. Segundo os levantamentos realizados, os fundadores da comunidade são descendentes de negros e negras escravos da região dos Cocais e Itapecuru. Eles se instalaram no território no final do século XIX, por considerarem o local seguro para viver.
O TRF-1 reconheceu “a necessidade de assegurar-se a integridade dos territórios afetados, os vínculos perenes com a terra, a garantia do respeito à ancestralidade dos moradores”.
Entre os elementos avaliados pela Corte estão a documentação apresentada pelos pretensos donos, julgada precária, frágil e controversa. Além disso, o Tribunal levou em conta as acusações de ameaças aos quilombolas, impedimentos de uso de terras, degradação de meio ambiente a partir de queimadas e destruição de residências dos remanescentes de escravos.
“Diante dos fatos, evidencia-se um risco à população local afetada, pois o cerceamento do plantio e da colheita, como se nota da documentação de acostada, põe em perigo o direito à alimentação, que é corolário do direito à vida”, menciona o relator, juiz federal Caio Castagine Marinho.
Ainda na decisão, foi determinada a restituição das áreas à comunidade no prazo de 15 dias. Também fixou multa de R$ 50 mil diários, em caso de descumprimento.
As demais peças técnicas do RTID seguem em elaboração até a titulação definitiva. Isso envolve etapas complexas, a fim de garantir a legalidade dos atos.
Ao final dos processos de regularização sob responsabilidade do Incra, é expedido um título, coletivo e em nome da associação legalmente constituída para representar a comunidade. As famílias não precisam pagar pelo documento. Ele não prescreve e a área titulada não pode ser dividida, vendida e nem penhorada.