Estudo do Ipea expõe distorções no sistema tributário brasileiro
Segundo o levantamento, contribuintes que ganham em média R$ 449 mil anuais pagam uma alíquota de 14,2%
Um diagnóstico do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgado nesta terça-feira (29), revela que as maiores rendas no Brasil são proporcionalmente menos tributadas do que os ganhos dos trabalhadores assalariados, evidenciando desigualdades que impactam a progressividade do sistema tributário. Assinado pelo economista Sérgio Wulff Gobetti, o estudo aponta que rendimentos oriundos de capital, predominantes entre os mais ricos, recebem uma carga tributária inferior à aplicada sobre os rendimentos do trabalho, afetando a justiça fiscal.
A análise, que contempla o Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas (IRPF), o Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), utilizou dados da Receita Federal para examinar essa distorção. Segundo o levantamento, contribuintes que ganham em média R$ 449 mil anuais pagam uma alíquota de 14,2%, equivalente ao percentual aplicado sobre salários de R$ 6 mil mensais. A progressividade dos tributos atinge o teto nos estratos superiores e, a partir desse ponto, começa a regredir. Contribuintes com renda média anual de R$ 1,053 milhão pagam 13,6% de imposto, enquanto aqueles com média de R$ 26,036 milhões recolhem apenas 12,9%.
Entre os declarantes no topo da pirâmide, a maior parte da renda é proveniente de ganhos de capital, juros e lucros, atingindo 81% no grupo dos 0,01% mais ricos. No contexto nacional, esse 1% mais abastado concentra 23,6% da renda disponível das famílias, um índice que reflete o alto grau de concentração de riqueza no Brasil.
O estudo destaca que essa regressividade decorre de “inúmeras distorções e privilégios perpetuados” no sistema tributário, entre eles a isenção sobre lucros e dividendos distribuídos a pessoas físicas, um benefício raro no cenário global, e as vantagens de regimes especiais de tributação. Essas estruturas, segundo Gobetti, incentivam planejamentos tributários que premiam empresas que limitam a escala de seus negócios aos regimes Simples e de Lucro Presumido. Entre 2015 e 2019, estima-se que cerca de R$ 180 bilhões deixaram de ser arrecadados pelas empresas nesses regimes; em valores atualizados, essa cifra chega a R$ 300 bilhões.
Em meio à tramitação da reforma tributária no Congresso, Gobetti afirma que é essencial incluir a equidade como um dos pilares das mudanças, de modo a não apenas reforçar a justiça fiscal, mas também a eficiência econômica. Na última semana, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou um plano de trabalho para avaliar a regulamentação dessa reforma, que poderá vir a corrigir as disparidades na tributação da renda e do lucro no país.