Brasil adota teste de DNA para rastreamento do HPV
O estudo revelou que o uso do teste de DNA-HPV aumentou em até quatro vezes a detecção de lesões pré-cancerosas
O Sistema Único de Saúde (SUS) se prepara para uma transformação significativa na prevenção do câncer de colo de útero. Em uma mudança anunciada em março, o exame citológico tradicional, conhecido como papanicolau, será substituído de forma gradual pelo teste de DNA para detecção do HPV. O novo método, que passou por uma avaliação rigorosa, tem como base os resultados de um estudo realizado em Indaiatuba (SP), liderado pelo Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher da Unicamp e financiado com apoio da farmacêutica Roche. O estudo revelou que o uso do teste de DNA-HPV aumentou em até quatro vezes a detecção de lesões pré-cancerosas, possibilitando que 83% dos casos de câncer fossem identificados em estágio inicial.
Durante o período de cinco anos do estudo, entre 2017 e 2022, foram rastreadas 20.551 mulheres na faixa etária de 24 a 65 anos, das quais 87,2% tiveram resultado negativo para o HPV, permitindo um intervalo seguro de cinco anos até uma nova testagem. O levantamento mostrou ainda que, em comparação ao papanicolau, o teste de DNA possibilita um diagnóstico até dez anos mais precoce, favorecendo um tratamento preventivo que reduz a necessidade de procedimentos invasivos e diminui os custos do SUS.
O professor Júlio Cesar Teixeira, diretor de oncologia do Hospital da Mulher da Unicamp e principal pesquisador do estudo, destaca que a tecnologia é custo-efetiva, especialmente considerando o longo prazo. Ao reduzir a incidência de câncer de colo de útero em fases avançadas e permitir a prevenção por meio da detecção precoce de lesões, o método também promete aliviar a sobrecarga de profissionais da saúde e otimizar recursos. Em entrevista à Agência Brasil, Teixeira explicou que o DNA-HPV é mais seguro, abrangente e eficaz, eliminando a necessidade de repetir exames anualmente como no papanicolau. Segundo ele, “o teste de DNA é todo automatizado e não tem falha.”
Essa mudança no método de rastreamento acompanha uma tendência global, observada em países como Austrália e Reino Unido, que iniciaram o uso do DNA-HPV em 2017. Com altas taxas de vacinação contra o HPV e a introdução desse novo teste, tais nações já projetam a erradicação do câncer de colo de útero até 2038. O Brasil pode alcançar resultados semelhantes se adotar uma política de rastreamento mais organizada e focada na cobertura ampla e eficiente.
Atualmente, a cobertura do papanicolau no Brasil é de apenas 15% a 30%, com grande desperdício de recursos pela repetição do exame em mulheres que já fazem acompanhamento regular. O novo modelo de rastreamento com o teste de DNA-HPV permitirá um maior controle e organização, evitando o desperdício e potencializando o impacto na saúde pública.
Outro ponto fundamental é a vacinação contra o HPV, que começou em 2014 para meninas entre 9 e 14 anos e deve gerar, a partir do próximo ano, uma geração de mulheres com menor prevalência do vírus. Esse avanço facilitará o uso do teste de DNA e, no futuro, poderá permitir que até 92% das mulheres realizem a autocoleta, simplificando ainda mais o processo e a logística do programa de prevenção.
A adoção do teste de DNA para HPV pelo SUS foi aprovada pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) após o estudo comprovar sua eficácia e viabilidade econômica. Atualmente, o Ministério da Saúde está definindo as diretrizes do programa, com previsão de replicar o modelo de Indaiatuba em todo o Brasil. Em uma perspectiva de longo prazo, a combinação da vacinação com o rastreamento via DNA-HPV promete transformar o câncer de colo de útero em uma doença rara no Brasil, eliminando milhares de casos por ano e salvando vidas.