Dona de terras em Jericoacoara pede indenização milionária por áreas do Parque Nacional

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Três processos tramitam na Justiça Federal do Ceará, há mais de 7 anos, com pedidos de indenização milionários da empresária Iracema Correia São Tiago por terras de fazendas dela incorporadas pelo Parque Nacional de Jericoacoara (Parna Jeri).

Em maio de 2017, a empresária processou o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão gestor da área de preservação ambiental, solicitando pagamento pela desapropriação das Fazendas Junco 1, Junco 2 e Caiçara, que tiveram áreas sobrepostas pela criação do Parque, em 2002.

Nesse pedido inicial, há 7 anos, a empresária solicitou R$ 55,5 milhões pelos três territórios. Ela já reivindicava este valor em setembro de 2010, quando ingressou com três processos administrativos junto ao ICMBio.

Já em 2022, uma perícia contratada por ela avaliou as terras em R$733,9 milhões. Nas mais de 5 mil páginas que compõem os processos judiciais, são atribuídos vários valores discrepantes aos territórios, ao longo dos anos.

As primeiras indenizações pedidas por Iracema, em 2017, foram de R$ 30,6 milhões pela Fazenda Junco 1, R$ 5,1 milhões pela Junco 2, e R$ 19,8 milhões pela Caiçara, totalizando os R$ 55,5 milhões iniciais.

Já em maio de 2019, engenheiros do ICMBio avaliaram as terras e concluíram que os “valores indenizáveis” seriam de R$ 1,1 milhão pela Fazenda Junco 1, R$ 770 mil pela Junco 2, e R$ 2,3 milhões pela Caiçara – o que somaria R$ 4,2 milhões.

Dois anos depois, em outubro de 2021, foi realizada uma perícia judicial nas terras. Mais uma vez, os valores divergiram dos encontrados antes: a Fazenda Junco 1 foi avaliada em R$ 140,4 milhões; a Junco 2, em R$ 71,9 milhões; e a Caiçara, em R$ 412,4 milhões. Total: R$ 624,7 milhões.

A União contestou o laudo da perícia, afirmando que “8,6 hectares da Fazenda Caiçara são terrenos de marinha”, ou seja, estão a menos de 33 metros de distância da linha máxima atingida pelo mar. Além disso, solicitou que “a manifestação detalhada relacionada ao laudo deve ser realizada pelo ICMBio e pelo Ministério do Meio Ambiente”.

Iracema São Tiago também contestou a perícia judicial, contratando um serviço privado para realizar nova análise – a qual trouxe os maiores valores ventilados em todo o processo desde 2017, somando uma indenização de R$733,9 milhões a serem pagos a ela pela União Federal.

Aos 487 hectares da Fazenda Junco 1, o engenheiro contratado pela empresária atribuiu o valor de R$ 164,5 milhões; aos 314,6 ha da Junco 2, de R$ 105,3 milhões; e aos 953 ha da Caiçara, de R$ 429,7 milhões.

Resumo dos valores
Valores pedidos inicialmente por Iracema São Tiago (set/2010 e mai/2017):

Fazenda Junco 1 – R$30.615.151,56
Fazenda Junco 2 – R$ 5.115.596,94
Fazenda Caiçara – R$ 19.816.990,11
Total –
R$ 55.547.738,61


Valores indenizáveis, segundo o ICMBio (mai/2019):

Fazenda Junco 1 – R$ 1.158.189,62
Fazenda Junco 2 – R$ 770.881,73
Fazenda Caiçara – R$ 2.314.142,65 (com sentença de mai/2024)
Total – R$ 4.243.214


Valores segundo a perícia judicial (out/2021):

Fazenda Junco 1 (457,6 hectares sobrepostos) – R$ 140.432.598,18
Fazenda Junco 2 (265,6 ha) – R$ 71.938.986,55
Fazenda Caiçara (953,8 ha) – R$ 412.406.636,01
Total – R$ 624.778.220,74


Valores perícia contratada por Iracema, contestando a judicial (fev/2022):

Fazenda Junco 1 (487 ha) – R$164.566.393.18
Fazenda Junco 2 (314,6 ha) – R$105.389.287,49
Fazenda Caiçara (953,8 ha) – R$429.723.738,00
Bem intangível – R$34.227.512,43
Total – R$733.906.931,10

Decisão da Justiça

Em maio de 2024, o primeiro dos três processos teve sentença proferida.

O juiz Sérgio de Norões Milfont Júnior, da 18ª Vara da Justiça Federal no Ceará, condenou o ICMBio a pagar a indenização pela Fazenda Caiçara – mas fixou o valor avaliado pelo órgão ambiental federal, R$ 2,3 milhões. Os advogados de Iracema recorreram.

Além disso, no mês seguinte, junho deste ano, a defesa de Iracema se adiantou e adicionou um “pedido de providência” nos dois processos que ainda estão sem sentença judicial, sobre as Fazendas Junco 1 e Junco 2.

No documento, os advogados apontam que o juiz “afastou completamente” a perícia judicial e a avaliação privada contratada pela empresária no caso da Fazenda Caiçara, “fazendo prevalecer o documento unilateral elaborado pelo ICMBio”.

“O ICMBio indica que o metro quadrado da região valeria ínfimos R$ 0,24, um verdadeiro absurdo. Em lugar algum se consegue comprar terrenos à beira-mar, ao lado de dois dos maiores e mais cobiçados destinos turísticos do Estado, a preço tão vil”, argumenta a defesa.
O ICMBio, por meio da Advocacia Geral da União (AGU), argumentou que Iracema São Tiago “já havia apresentado razões finais, sendo descabida, portanto, a apresentação de novas alegações”.

Os três processos seguem tramitando na Justiça Federal, dois deles – sobre as Fazendas Junco 1 e 2 – ainda sem sentença.

O que dizem os envolvidos
O Diário do Nordeste contatou a defesa de Iracema, por meio de assessoria de comunicação, para obter retorno sobre detalhes dos processos e qual o valor atual da indenização pedida pela proprietária das terras à União Federal.

Os advogados informaram que o ICMBio já reconheceu a titularidade das terras, e chegou a propor que Iracema as “doasse” para a criação do Parna de Jericoacoara. “Em outros momentos, o Instituto reconheceu que não dispunha de dinheiro para pagar, por falta de previsão orçamentária”, acrescentam.

“Quanto aos valores de indenização, qualquer número citado atualmente não corresponderá ao que deverá ser pago ao final da ação. O pedido de indenização vem desde 2010”, reforçou a defesa.
A reportagem também contatou o ICMBio, que é vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), para saber em que pé estão as negociações, se o instituto está disposto a indenizar a empresária pelas terras e, em caso afirmativo, qual seria o valor.

Em nota, o ICMBio informou que não comenta processos judiciais, e acrescentou que “vem conduzindo os processos de regularização fundiária nas áreas particulares sobrepostas ao Parque Nacional de Jericoacoara, conforme determina a legislação vigente”.

Vila de Jericoacoara

Essa disputa judicial é paralela à questão que envolve os moradores da Vila de Jericoacoara, território do qual Iracema teria direito à propriedade de 80% das terras. Neste caso, que está sendo tratado extrajudicialmente, a empresária reivindica apenas as áreas desocupadas da Vila.

No acordo estabelecido com a Procuradoria Geral do Estado (PGE), Iracema ficaria com uma área equivalente a 4% da qual teria direito em escrituras públicas.

O Conselho Comunitário de Jericoacoara se manifestou contra a transferência das terras, e goza de um prazo de 20 dias dado pela PGE para contestar, documentalmente, o acordo. O prazo finda no dia 4 de novembro.

Fonte: Diário do Nordeste

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