A nova edição do relatório Conflitos da Mineração no Brasil, publicado anualmente pela Universidade Federal Fluminense (UFF), contabilizou 901 ocorrências em 2023, abrangendo 786 localidades. Embora os números indiquem estabilidade em relação ao ano anterior, o total de pessoas envolvidas aumentou significativamente, saltando de 688 mil em 2022 para 2,81 milhões em 2023, um crescimento de 308,1%.
O estudo, coordenado pelo geógrafo Luiz Jardim Wanderley, é resultado de uma parceria com o Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente à Mineração. A pesquisa abrange conflitos em áreas rurais e urbanas, englobando desde danos humanos até impactos socioeconômicos. Entre os registros estão remoções forçadas, contaminação, restrições de acesso à água, pressões e ameaças, além de 41 casos de mortes.
Minas Gerais e Pará seguem como os estados mais afetados, concentrando a maioria dos conflitos. O território mineiro lidera com 31,9% das localidades impactadas, seguido pelo Pará com 13,7% e pela Bahia com 9%. Minas Gerais também possui o maior percentual de atingidos, reflexo das tragédias das barragens da Samarco (2015) e da Vale (2019), cujos desdobramentos ainda geram disputas judiciais e reivindicações por reparos. Brumadinho, epicentro de um dos desastres, foi o município com mais ocorrências pelo quarto ano consecutivo.
O Pará responde por 12% das pessoas afetadas, enquanto Alagoas aparece em terceiro lugar com 10,1%. Em Maceió, os impactos da mineração de sal-gema pela Braskem levaram ao afundamento de cinco bairros, desencadeando diversas mobilizações de moradores em busca de medidas reparatórias.
O relatório também lista 122 empresas envolvidas nos conflitos. A Vale lidera com 147 ocorrências, seguida pela Braskem (50), Companhia Siderúrgica Nacional (39), Samarco (39), Tombador Iron Mineração (25), ArcelorMittal (15) e Belo Sun Mining (15). Os biomas mais impactados foram a Mata Atlântica (48,5%) e a Amazônia (27,4%), com 96 conflitos envolvendo comunidades indígenas e 60 relacionados a quilombolas.
Diante dos dados apresentados, empresas citadas no relatório divulgaram notas justificando suas atuações. A Vale afirmou adotar medidas para garantir operações responsáveis e sustentáveis, com foco em direitos humanos e relacionamento com comunidades. Segundo a mineradora, 75% dos valores destinados à reparação de Brumadinho já foram desembolsados e 17 mil pessoas firmaram acordos individuais de indenização.
A Braskem, por sua vez, informou que desde 2019 tem se empenhado em mitigar os impactos em Maceió, com mais de 18,9 mil indenizações pagas. A Companhia Siderúrgica Nacional alegou que não teve acesso ao relatório, argumentando que a empresa atua em diversos segmentos e que a inclusão de informações de outros setores pode distorcer os resultados.
A Samarco também afirmou não ter tido conhecimento do documento, mas destacou investimentos em projetos socioambientais e a adoção de novas tecnologias para dispor rejeitos sem o uso de barragens. A mineradora enfatizou ainda que o recente acordo de reparação dos danos de Mariana busca uma solução definitiva para as demandas judiciais. Outras empresas citadas no relatório não responderam aos pedidos de esclarecimento.
Os dados do estudo apontam que os conflitos relacionados à mineração permanecem uma questão crítica no Brasil, envolvendo milhões de pessoas e gerando impactos ambientais e sociais significativos. O relatório reafirma a necessidade de maior regulação e fiscalização das atividades mineradoras no país.