Daniel Silveira peita Alexandre de Moraes e acampa no Congresso
Cansado de ser alvo das reiteradas decisões autoritárias do ministro Alexandre Aloprado de Moraes, o deputado Daniel Silveira radicalizou. Jogou fora a tornozeleira eletrônica e resolveu acampar em seu gabinete da Câmara dos Deputados. Ameaça morar lá até que o presidente da Câmara, Artur Lira, paute as deliberações sobre sua prisão e medidas cautelares contra ele.
Inconformado com o inconformismo do parlamentar, o ministro do STF determinou, logo depois do anúncio da insubordinação do deputado, que a polícia do Distrito Federal e também a Polícia Federal fosse colocar o colarinho de perna, até mesmo na jurisdição do Congresso, se necessário. Deve ter prevalecido o bom senso, raro na cabeça lustrosa, pois não se deu a invasão, que poderia descambar para um crise institucional.
Num inquérito eivado de medidas inusitadas, chamado na época de sua eclosão de “inquérito do fim do mundo” por Marco Aurélio Melo, o deputado Daniel Silveira teve seus direitos cassados. Preso por iniciativa própria do juiz (de ofício), num flagrante continuado jamais visto, em sua casa, de noite, por ter disseminado um vídeo com palavras desabonadoras aos togados do STF.
Em flagrante desrespeito ao artigo 53 (inviolabilidade parlamentar por QUAISQUER palavras), Daniel Silveira foi para a prisão de forma preventiva, o que também não se aplica a parlamentares. A não ser em flagrante por crime inafiançável. Se não há os pré-requisitos, inventem-se. Com uma Constituição ad hoc debaixo do paletó, para atender seu desiderato, Moraes viu prosperar sua ação quando o Congresso se ajoelhou e confirmou a prisão de Silveira.
Qual mesmo o crime, um discurso confuso, irado, dito e tido como antidemocrático? Na interpretação de quem? Dizer que alguém merece apanhar com um gato morto é uma contribuição à incivilidade nas relações pessoais e uma peça de deselegância de descortesia. Poderia ser alvo de uma representação no conselho de ética. Poderia dar azo até a uma cassação de mandato. Jamais uma prisão preventiva.
Ao sair do presídio, por benemerência de Moraes, Silveira deveria portar uma tornozeleira, mas proibido de dar entrevistas, participar de ato público ou se locomover fora da área estabelecida pela Justiça. Virou um cidadão de segunda categoria, um deputado impedido de exercer plenamente seu mandato. O ato antidemocrático, fácil de falar na dicção moraeseana, parte do próprio ministro: o descumprimento da Constituição.
O deputado ainda passou um período extra hospedado na penitenciária porque teria rompido a tornozeleira, para fugir da restrição. Embora negasse com veemência, passou mais seis meses no xilindró, quando o laudo da Polícia Federal atestou que ele não tinha rompido o dispositivo. Foi um problema técnico, que privou as filhas do deputado da presença do pai por meio ano. Quem vai pagar por isso?
Na última semana, o deputado participou de um ato público, saiu da zona de restrição e esteve no mesmo evento com outro envolvido no inquérito. Só por isso, a lépida Lenora, do Ministério Público, pediu-lhe a prisão. Moraes, o condescendente, optou pelas medidas cautelares, mas, de novo, sem dar bola ao que manda a Lei: encaminhar o caso ao Legislativo para ratificar ou não a sua decisão.
Foi quando o deputado resolveu dar um basta e chamar atenção para os desmandos. Segundo ele, não estaria descumprindo a uma ordem judicial, mas obedecendo à Constituição. O ato de acampar no Congresso é mais que um protesto contra as medidas arbitrárias, é para exercer pressão no presidente da Casa para deliberar sobre os atos de Moraes em relação ao parlamentar.
Se a Constituição for cumprida, o que não é muito seguro, a Câmara tem que decidir sobre a prisão do deputado. Mais que uma questão pessoal, uma defesa da instituição. Tanto aloprou o ministro Alexandre, e muitos deputados, que antes votaram pela prisão de Silveira, estão dispostos a dar o troco. Para deixar claro: cada um no seu quadrado. A Lei acima de tudo, a Constituição acima de todos.