O time e o timing da Petrobrás

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O petróleo jamais foi nosso. Aliás, nenhuma das commodities. Vendemos matéria-prima a preço de banana e somos ludibriados com quinquilharias industrializadas no exterior. Pagamos em dólar o mico do valor agregado. De que fale a Petrobrás ser nossa se o lucro auferido não chega ao povo? Não se devem desobedecer às leis de mercado, a não ser durante tragédias, como guerras e pandemias. E é o que temos.

A travessia da pandemia já tinha sido suficiente para varrer o mundo, não apenas com o bafio mortal exalado pela praga que se espalhou do Oriente ao Ocidente, mas também pelas mazelas na economia. Juntaram-se dois ingredientes que fermentam a inflação: crescimento da demanda, com aumento do poder de compra das massas por meio de auxílios governamentais, e a queda na oferta de alimentos e outros itens, cuja queda de produção foi provocada pela quarentena.

A economia mundial foi devastada, com forte impacto nas bolsas. Com exceção da China e países menos relevantes, o mundo entrou em recessão. O Brasil retroagiu um pouco mais de 4%, em 2020, contra expectativa de um índice superior a 10%, como ocorreu na Argentina e em vários países da Europa. Recuperou-se no ano seguinte e já se preparava para alçar voo quando outra praga, também de alcance mundial, surgiu no horizonte.

A guerra na Ucrânia, com a invasão da Rússia, incendiou o preço dos combustíveis. Circunscrita no extremo europeu, as fagulhas crepitaram mundo afora. Como instrumento de geopolítica, alimentos e combustíveis são manipulados como armas, além dos artefatos bélicos. Rússia, grande exportadora de combustíveis, responsável pelo abastecimento de gás para a Europa, fechou os portos da Ucrânia, impedindo a exportação de uma das maiores produtoras de alimentos (grãos) e fertilizantes.

Fome e frio, muitos passarão se o conflito se estender indefinidamente ao redor do teatro de guerra. O Brasil já é acossado pela inflação dos alimentos e dos combustíveis. Começa a ter escassez de alimentos, não apenas pela falta de produção, mas pelo preço do transporte encarecido pelo custo do diesel.

Toda empresa, por mais que vise o lucro, tem também um fim social. Principalmente se é uma estatal, como no caso da Petrobrás. Abalada pela devastação provocada pelos governos petistas, a estatal passou por um plano de recuperação dos prejuízos e resgate de sua credibilidade. Com esse propósito, instalou-se uma nova política de preços, com paridade internacional e balizada pelo dólar.

Assim como a PEC do Teto de Gastos, foi medida emergencial para dar confiabilidade aos investidores. Com a conjuntura econômica atual, essa política alavancou os lucros da empresa, trazendo ganhos para seus donos no Brasil e mundo afora. “Um estupro”, bufou Bolsonaro. Mas o povo, o maior acionista, não se viu contemplado.

Sem vacina para a inflação, a não ser a terapia clássica de alta nos juros, o governo ampliou a isenção de impostos e tem tentado a todo custo sensibilizar a diretoria da Petrobrás a segurar os preços, não acompanhar com tanta frequência a volatilidade dos mercados. Sem sucesso, trocou vários diretores, como quem troca técnicos de um time de futebol que ainda não conseguiu vitórias. Pressionado pela torcida, trocou também o ministério.

Bolsonaro, tal cachorro que tenta se livrar das pulgas, joga a culpa da alta na Petrobrás. E agora achou mais elemento para acender o sinal de alerta. A Bolívia acaba de cortar 30% do fornecimento de gás natural ao Brasil, dando preferência à Argentina, que ofereceu melhor preço. Ao ter que importar de outro produtor, o preço deve ser cinco vezes maior do que o contratado com os bolivianos.

O presidente, gato escaldado por tantas traições de quem lhe é próximo, teve medo do banho de água fria imposto pelo país vizinho, que já se aproveitara do Brasil no episódio da estatização da petrolífera brasileira que teve sua sede boliviana invadida pelo exército local. Bolsonaro acha que a Petrobrás foi negligente ao não cobrar o cumprimento do acordo. Pelo sim, pelo não, mais um presidente deve chegar à companhia. E deve ter uma degolada geral na diretoria.

Com o imbróglio, nota-se o nítido fortalecimento de Paulo Guedes. O novo ministro das Minas e Energia, Adolfo Sacshida, era seu auxiliar. E o novo presidente da petroleira, Caio Paes de Andrade, era seu preferido para o cargo desde a última dança de cadeiras. Agora, pelos menos, temos um alinhamento. Guedes defende o espaçamento dos reajustes. Seria uma questão de timing. Deve ser a chave da nova administração. Se o time ganhar, continua no cargo.

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