A princesa que veio do Norte

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Depois de muita pressão, a governadora Izolda Cela cede e aceita a redução do ICMS nas contas de luz, combustíveis, telecomunicações e transportes. Ceder e aceitar são verbos da retórica, pois não cabe a ela desobedecer lei federal, sob pena de cometer crime de responsabilidade, o que poderia incorrer num inusitado impeachment de seu tão incipiente governo. Por isso e para não perder a majestade, insiste em questionar judicialmente a proposta de emenda parlamentar aprovada por quase unanimidade no Senado. A desolada Izolda não teme passar a imagem de inimiga do povo desde que não desagrade o eleitorado que realmente importa, a oligarquia dos conterrâneos.

Como a rainha que sugeriu brioches a quem tinha fome de pão, a insensibilidade de Izolda só se iguala ao discurso dos tecnocratas liberais que elevam o ajuste fiscal ao status de deidade. Pouco importa se há choro e ranger de dentes, na crença de que o sofrimento é inexorável aos seres terrenos e os redime de seus pecados. A carestia provoca dores lancinantes a quem anda de estômago e olhares vazios.

A brutalidade governamental é ainda maior diante do discurso de que o Ceará é um dos estados com maior eficiência fiscal, com suas contas ajustadas. A que serve o ajuste fiscal se não em benefício do povo? E deitam falação falaciosa: “Ah, mas vai provocar inflação, vai deteriorar as contas do governo, vai comprometer o futuro”. Não há futuro para quem não tem presente, a pandemia reforçou esse aprendizado.

Se puderam dizer “a economia a gente vê depois”, o mesmo vale para o ajuste fiscal. Quando uma torrente de recursos abarrotou os cofres estaduais ninguém ousou falar em sanidade das contas públicas. Tudo era emergencial. A emergência agora é outra, mas atinge com mais rigor os vulneráveis. Os poderosos foram os primeiros a se infectar no Ceará, mas nenhum deles sabe o que é jejum forçado.

Estamos num paradoxo provocado pela batalha que empreendemos contra o vírus e pela guerra provocada no leste europeu que atinge a todos, também de forma pandêmica. A economia brasileira surpreende na recuperação, mas as consequências para o bem-estar do povo ainda demoram pois estão em vigor os malefícios da política do “fique em casa”, praticada por aqueles que agora se voltam contra medidas de mitigação.

A grita de queda da arrecadação é outra falácia para justificar aumento de impostos em outras áreas. Afinal, o dinheiro economizado na redução de impostos não será incinerado nem depositado sob o colchão. Será usado para pagar outros impostos embutidos em produtos que se tornaram de luxo, como a carne para um pirão. Avisem à princesa que veio do Norte que a cara da fome tem o semblante da morte. E o povo quer vida, em abundância.

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