Entre a falta de água e a água suja

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Sobralito enfrenta um final de semana de escolhas difíceis

Aquele domingo de Sol prometia. Cedo da manhã, dona Eulália já havia preparado tudo, antes de deixar a casa arrumada. Ela detestava bagunça e, sempre que tinha algum compromisso nos finais de semana, já deixava tudo limpo para quando voltasse.

— Mania de limpeza, mãe!

Era o que Sobralito falava, todas as vezes, antes de saírem. E naquele domingo, não seria diferente. Os dois tinham planejado visitar a tia de Sobralito, que morava nas Contendas, uma localidade, numa Serra perto da cidade.

Fazia tempo que os dois não iam para aqueles lados. Então, para não chegar de ‘mãos abanando’, dona Eulália separou um litro, bem gelado, de refrigerante, um bolo e mini-cachorros quentes. Afinal, ela não sabia quantas pessoas da família estariam na casa da irmã, além do casal e dos dois filhos; um da idade de Sobralito.

Depois de alguns minutos de estrada, os dois chegaram à localidade. E dona Eulália foi recebida com alegria, mas um certo ar de preocupação. É que não havia água no lugar. Fazia muito tempo que as famílias pediam por encanamento e nunca haviam sido atendidas pela rede, responsável pelo serviço.

— Pôxa, minha irmã, me desculpe. Não tive como te informar, porque aqui é ‘ruim de linha de telefone’ — lamentou a irmã de dona Eulália, enquanto recebia mãe e filho com um olhar de velada decepção.

— Pois é, Diva — falou Eulália —, então faz tanto tempo assim que não venho aqui? Nem lembrava desse problema.

É que nós temos cisterna, Eulália, mas água encanada, não. E isso faz uma falta danada. Nós, até, juntamos um dinheiro com outras famílias daqui e compramos canos. Quase R$ 4 mil e quinhentos reais de material para ver se nós mesmos resolvemos esse problema, que dura anos. É tanta promessa, tanta conversa, que a gente acredita que alguma coisa vai mudar; que a vida vai melhorar, mas se a gente mesmo não arregaçar as mangas…sei não viu?!

Reclamava a dona de casa, terminando a galinha caipira que estava borbulhava numa enorme panela com legumes.

Enquanto os meninos brincavam no quintal, as duas irmãs jogavam conversa fora, até que o celular de dona Eulália tocou alto.

— Alô! Eulália? É a Maria José. Menina, estamos chegando por aí. Vamos demorar um pouco, é que hoje a água daqui de casa chegou da cor de chocolate. E toda oleosa. Pense no aborrecimento… Ainda tinha planejado fazer dois cabelos, aqui no salão, antes de sair de casa, mas nem tem como. Vou já ‘arribar’ daqui com o Tonho e a Maria Cecília. Chegaremos já, já. Pede à Divina que aumente essa água do feijão.

Gritou, do outro lado, a irmã de dona Eulália, que morava no distrito de Aracatiaçu, lá para outras bandas do município. Ali, a água, vez ou outra, saía das torneiras, visivelmente imprópria para beber. Da cor, mesmo, de um achocolatado. E dessa vez, com uma certa oleosidade.

Ali perto, Sobralito havia parado de brincar e prestava atenção à conversa.

— Sei não. Uma hora não tem água, na outra tem, mas está suja. Vou falar sobre isso na próxima redação, na escola. A falta que a água faz e como a gente sofre com isso — disse o menino, falando sozinho, enquanto voltava para o quintal. O time dele estava perdendo de 2×0.

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