Pelo direito a um salário melhor
Sobralito e a mãe são surpreendidos por uma manifestação de profissionais de saúde no Centro da Cidade.
Naquela tarde de quinta-feira, Sobralito vinha das compras com dona Eulália, quando os dois se depararam com uma multidão que tomava as ruas do Centro da Cidade. Com faixas, cartazes e palavras de ordem, o grupo pedia mais respeito e uma solução para o impasse que tomou o Brasil, nos últimos meses. Aliás, uma luta que já se desenrola faz anos.
Enfermeiros, técnicos e outros profissionais da saúde, já cansados de tanta desvalorização do salário iam, mais uma vez, às ruas para protestar. O vai e vem das decisões políticas e judiciais sobre a questão, deixava claro que a batalha não chegaria a um final positivo aos profissionais, pelo menos nos próximos dias de votação, questionamentos e tomadas de decisão.
— Mãe, olha lá a dona Eunice, aquela enfermeira que mora perto de casa.
— Eu vi, meu filho. Faz meses que essa pobre espera esse aumento de salário. Já vem fazendo, um monte de contas e planos e cálculos de como gastar a bolada, mas acho que o estresse nem vale a pena.
Enquanto a mulher lamentava pela situação da amiga, o grupo circulava a Praça de Cuba, e se preparava para descer pela rua principal, até o Becco do Cotovelo. O Centro fervilhava, nessa hora.
E para surpresa de dona Eulália e Sobralito, que haviam parado para ouvir o que diziam os manifestantes, dona Eunice pegou, de repente, um megafone e teve seu apelo potencializado.
A voz firme da mulher encheu a praça de uma vibração que comoveu muita gente.
— Gente, eu perdi tantos amigos de profissão, não só aqui, mas em todo esse Brasil, por causa da covid-19. A gente nem teve tempo de se despedir. Infelizmente, nessa luta, a gente perdeu muita gente boa. Muito profissional que não temia estar na linha de frente contra essa doença terrível.
A voz de dona Eunice ganhava, cada vez mais força. Enquanto mais faixas e cartazes eram erguidos com dizeres contra a medida, que ainda impedia que o piso da categoria fosse reajustado.
— Juntos somos mais fortes. Não vamos nos calar. O Brasil, os políticos e os magistrados precisam saber que estamos aqui, e não vamos desistir. Apesar das ameaças de demissão, desse jogo de decisões contra e a favor, estamos aqui e não vamos arredar o pé, até que a gente consiga ver concretizado um direito pelo qual nós lutamos faz anos.
Nessa hora, as palmas e gritos tomavam conta do lugar e dona Eulália estava admirada da atitude firme da vizinha, a quem ela se ‘consultava’, quando precisava de algum remédio.
— Nossa, não sabia que dona Eunice era tão corajosa, além de boa enfermeira. Se essa mulher se candidatar a vereadora, eu voto nela, com certeza.
Enquanto o grupo descia a rua no sentido Becco do Cotovelo, Sobralito e dona Eulália corriam para pegar o ônibus que chegava. Na cabeça da doméstica, se mantinha firme a imagem da vizinha com aquele megafone na mão, em busca por um direito, até então negado, como ela dizia.
Na mente de Sobralito passava a ideia de uma entrevista com dona Eunice, para um próximo podcast sobre profissões.