Bancada feminina na Câmara prioriza políticas de cuidado

Foto: Gpointstudio/DepositPhotos
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O movimento reflete a crescente pressão por mudanças no cenário de sobrecarga de trabalho doméstico sobre as mulheres

As políticas de cuidado estão ganhando cada vez mais espaço no debate público brasileiro, com destaque no Parlamento e apoio expressivo da bancada feminina. Recentemente, a Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados estabeleceu dois grupos de trabalho (GTs) para tratar do tema: um focado nas políticas de cuidado e outro para discutir a ampliação da licença-paternidade. O movimento reflete a crescente pressão por mudanças no cenário de sobrecarga de trabalho doméstico sobre as mulheres, que, segundo dados do IBGE, dedicam em média 21,3 horas semanais a tarefas domésticas e ao cuidado de pessoas, enquanto os homens dedicam apenas 11,7 horas.

O tema também é uma prioridade para o Poder Executivo, que enviou à Câmara dos Deputados o projeto de lei 2762/24, instituindo a Política Nacional de Cuidados. A proposta, construída com a participação de 20 ministérios e de atores locais e regionais, visa não apenas aliviar a carga das mulheres, mas também garantir que o cuidado – especialmente voltado para crianças, idosos e pessoas com deficiência – seja realizado com qualidade e em condições decentes para os trabalhadores remunerados do setor. Atualmente, esse trabalho é majoritariamente exercido por mulheres negras em condições de informalidade e precariedade.

A realidade é que, apesar do cuidado ser uma responsabilidade social compartilhada, ele recai desproporcionalmente sobre as mulheres, especialmente as mais pobres. Segundo o IBGE, a taxa de participação feminina no mercado de trabalho em 2022 foi de 53,3%, contra 73,2% dos homens, com rendimentos femininos correspondendo a apenas 78,9% dos masculinos. Além disso, as mulheres negras dedicam, em média, 1,6 hora a mais por semana em tarefas domésticas do que as brancas, evidenciando uma sobrecarga ainda maior para essas trabalhadoras.

Para transformar esse cenário, especialistas defendem que as responsabilidades de cuidado sejam distribuídas entre Estado, família, mercado privado e comunidade. O projeto de lei 2762/24 vai nessa direção, buscando não apenas aliviar a sobrecarga das mulheres, mas também assegurar que o cuidado seja acessível a todos, especialmente os mais vulneráveis. Segundo Luana Pinheiro, diretora de Economia de Cuidado do Ministério do Desenvolvimento Social, “o cuidado é fundamental para a nossa organização social, mas ele ainda é visto como uma responsabilidade individual e familiar, o que perpetua a desigualdade de gênero e de raça no Brasil”. Ela ressalta a necessidade de que o Estado assuma um papel mais central, especialmente no que diz respeito ao trabalho remunerado de cuidado, que envolve cerca de seis milhões de pessoas, das quais 90% são mulheres.

No Congresso, o projeto tem sido articulado pela bancada feminina, que, segundo a deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP), está unida em torno do tema. Bomfim é a relatora do grupo de trabalho sobre políticas de cuidado e defende que a aprovação do PL 2762/24 seja o primeiro passo para avançar em outras legislações complementares. Entre elas, está a criação do Fundo Nacional do Cuidado e a PEC do Cuidado, que busca inserir o cuidado como um direito social na Constituição.

Outras iniciativas complementares, como o PL 638/19, da deputada Luizianne Lins (PT-CE), que propõe a inclusão do trabalho não remunerado no cálculo do PIB, e o PL 5791/19, da deputada Leandre (PR), que institui uma política de cuidados para pessoas vulneráveis, também estão em discussão. Essas medidas representam um esforço coletivo para repensar o papel do cuidado na sociedade brasileira, reconhecendo-o como uma responsabilidade de todos e não apenas das mulheres.

O movimento por políticas de cuidado no Brasil é, portanto, uma questão de justiça social e de igualdade de gênero. O reconhecimento e a formalização desse trabalho são passos essenciais para construir uma sociedade mais equitativa, onde o cuidado seja valorizado e compartilhado. O debate em curso no Congresso aponta para essa direção, com uma série de propostas legislativas que, se aprovadas, podem transformar significativamente a vida de milhões de mulheres no país.

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