A alfabetização de jovens e adultos no Brasil ganhará um novo direcionamento com a inclusão de temas voltados para o uso das tecnologias digitais. Enviar mensagens de texto, identificar golpes online, utilizar aplicativos bancários e criar perfis em redes sociais estarão entre as habilidades abordadas na formação de alfabetizadores da Educação de Jovens e Adultos (EJA). A capacitação começou neste mês e segue até 2026.
A iniciativa faz parte do Programa de Formação de Alfabetizadores e Docentes dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, desenvolvido pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) em parceria com o Ministério da Educação (MEC) e a Cátedra Unesco de EJA. “A ideia é que essas tecnologias sejam exploradas de forma crítica, permitindo que os estudantes compreendam seu uso como uma ferramenta que pode auxiliar sua vida”, afirma Daniele Dias, professora da UFPB e coordenadora do programa.
O curso alcançará 1,3 mil formadores regionais, que serão responsáveis por multiplicar o conhecimento para coordenadores e professores em todo o país. A formação integra o Pacto pela Superação do Analfabetismo e Qualificação na EJA, lançado em 2023 pelo governo federal para ampliar a educação de jovens, adultos e idosos.
No Brasil, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 11,4 milhões de pessoas com 15 anos ou mais não sabem ler e escrever. Com as novas diretrizes, a alfabetização passa a considerar também a integração digital, uma necessidade cada vez mais presente na vida cotidiana. “O analfabetismo tem um impacto até mesmo na vida afetiva, já que algumas dessas pessoas não conseguem criar um perfil em aplicativos de namoro ou sequer ler mensagens no WhatsApp”, destaca Dias.
A educação midiática também terá papel essencial, ajudando a prevenir golpes e a disseminação de informações falsas. “Essas pessoas precisam ser orientadas sobre segurança digital para evitar que caiam em fraudes na internet”, completa a professora.
Criada nos anos 1940, a EJA passou por diversos desafios ao longo das décadas, e um dos maiores ainda é a evasão escolar. Dados do IBGE mostram que 46,8% dos brasileiros com 25 anos ou mais não concluíram o ensino médio. Além disso, o número de matrículas na EJA caiu de 3,2 milhões em 2019 para 2,5 milhões em 2023, enquanto os investimentos também sofreram reduções significativas.
Outro desafio apontado pelos especialistas é a falta de formação específica para os professores da EJA. Na maioria das redes de ensino, esses profissionais assumem as turmas como carga suplementar, sem capacitação adequada para lidar com um público diverso, que inclui jovens, adultos, idosos, pessoas com deficiência e trabalhadores informais.
Para transformar essa realidade, o curso aposta em um modelo de ensino inspirado na perspectiva de Paulo Freire, valorizando os conhecimentos prévios dos estudantes e reconhecendo-os como agentes transformadores de suas próprias vidas. “Não se trata apenas de ensinar a ler e escrever, mas de proporcionar ferramentas para que esses estudantes exerçam plenamente sua cidadania”, conclui Daniele Dias.