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00135.221559/2021-89 |
MINISTÉRIO DA MULHER, DA FAMÍLIA E DOS DIREITOS HUMANOS
OUVIDORIA NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS
Relatório DE ACOMPANHAMENTO DE CASO
Processo nº 00135.219879/2021-79
Interessado(s): Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos
Assunto: Denúncia e Tortura e exposição de preso à risco de morte
A presente informação tem o escopo de reportar a Vossa Senhoria as constatações resultantes da visita ao Complexo Penitenciário da Papuda em Brasília/DF, realizada em 24 de setembro de 2021, pelos servidores Eduardo Miranda Freire de Melo, Secretário Nacional Adjunto de Proteção Global, Marco Vinicius Pereira de Carvalho, Membro do Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, Vandervaldo Gonçalves Lima, Coordenador de Atendimento à Violações de Direitos Humanos, e João André Alves Lança, Coordenador-geral de Combate à Tortura e Violência Institucional.
A visita foi realizada para verificação das condições de encarceramento, físicas e psicológicas, do Senhor WELLINGTON MACEDO DE SOUZA, que está sob custódia do Estado Brasileiro, no Centro de Detenção Provisória II - CDP II, no Complexo Penitenciário da Papuda e sob a administração da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Distrito Federal - SEAPE, considerando notícias acerca do seu estado de saúde, circunstâncias que cercam o caso e denúncia de que ele estaria sendo vítima de tortura ou outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes.
I - DA DENÚNCIA DE TORTURA E RISCO DE MORTE
De início, em 21 de setembro de 2021, a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos recebeu denúncia de que um detento estaria com grave problema de saúde, sendo privado de cuidados urgentes, correndo risco morte, além de estar sem contato com os seus defensores.
Tratava-se do jornalista WELLINGTON MACEDO DE SOUZA e o comunicado partiu de uma de suas defensoras, informando que somente conseguiu contato com o preso quinze dias após a sua prisão (SEI nº 2491373).
Na Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos a denúncia foi registrada sob o protocolo 2491686 e encaminharam-se ofícios com pedido de providências para a Ouvidoria-Geral do Ministério Público Federal (2491843) e para a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Distrito Federal (2491847).
II - DAS VISITAS E DAS CONSTATAÇÕES
Diante dos fatos e considerando a gravidade da situação apresentada, a Senhora Ministra de Estado da Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, na qualidade de Presidente do Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, designou comitiva para que se deslocasse até o presídio em questão e realizasse verificação pessoal dos fatos e suas circunstâncias.
II.I - Visita ao Complexo Penitenciário da Papuda
A visita foi precedida de autorização expedida pela Vara de Execuções Penais (2503384).
No dia 24 de setembro de 2021, por volta das 15 horas, fomos recepcionados no Centro de Detenção Provisória II (CDP II), pelo Gerente de Segurança, agente Pimenta e também pelo agente Praxedes. O local é onde se encontra preso o sr. Wellington Macedo de Souza.
Nos deparamos com um pátio limpo, organizado, paredes do local de triagem limpas, com informações para o cidadão e controle de entrada, local onde, após sermos identificados, foram retidos os aparelhos de telefones celulares.
Tão logo acessamos as instalações do CDP-II, fomos levados para a equipe médica do local para triagem no que diz respeito à COVID, onde foram realizadas perguntas acerca das nossas condições e saúde e aferida a temperatura corporal.
Já no local, buscamos conversar com o médico Rafael, que atende os internos, e indagado sob as condições de saúde do interno Wellington, mostrou-se evasivo e disse que nada poderia informar devido ao sigilo profissional entre médico e paciente.
Na sequência, a equipe foi levada até o bloco onde está o custodiado, no Bloco 5 do CDP II. Destaca-se que o Bloco 5, segundo informações do Agente Pimenta, é destinado aos presos em quarentena em decorrência da COVID, ou seja, tão logo ingresse no complexo o preso é mantido por quatorze dias neste bloco e, então, é transferido para blocos distintos.
No caso do preso Wellington, o referido se encontra naquele local desde o dia da sua chegada à prisão, no dia 03 de setembro de 2021.
Passamos pelo controle de entrada do Bloco 5 e por portões altos e com grades e, ao adentrarmos no prédio, sempre acompanhados pelos dois gentes, fomos levados até a cela onde está custodiado o sr. Wellington. As instalações gerais do prédio são novas e a cela, onde está confinado o preso em questão, mede cerca de 12 m2 (doze metros quadrados), estava limpa, possui um chuveiro, uma pia e um sanitário, além de um colchão e dois cobertores. O custodiado estava sozinho em sua cela e informou que sempre esteve sozinho desde a sua prisão. O local é arejado, com ventilação adequada, sem possibilidade de fechamento por janelas e não tem sinais de infiltração ou mofo.
O horário de chegada da Equipe ao local de encarceramento coincidiu com aquele em que o preso estaria saindo para o seu banho de sol, no entanto, os agentes penais relataram que Wellington não possui condições físicas para manter-se de pé, o que dificulta a sua locomoção. Tanto é verdade que a visita teve de ser realizada no interior da cela, pois o preso não conseguiu se dirigir à sala que estaria disponibilizada para o atendimento da Equipe do MMFDH, situada do lado de fora do Bloco 5.
No local, há uma bancada que serve como cama, mas por uma opção do preso, o seu colchão estava no chão. Sobre essa bancada haviam duas marmitas intactas, alguns sucos, algumas bebidas lácteas achocolatadas, algumas bananas e materiais de higiene pessoal, para uso do custodiado.
O senhor Wellington asseverou não ter qualquer reclamação do local onde estava, ressaltou o cuidado dos policiais penais consigo e da forma atenciosa como vem sendo tratado na unidade prisional. Fez questão de uma referência especial aos agentes penais.
Pudemos constatar, portanto, condições favoráveis de encarceramento, com garantias básicas de proteção e segurança pessoal.
II.II - Das condições pessoais, de saúde e psicológicas.
O preso se mostra muito fraco, muito abatido e falando baixo, além de chorar constantemente. Informou que já foi atendido por um médico e por dois psicólogos em momentos distintos, mas que as consultas têm sido protocolares, já que os profissionais não o examinam e apenas perguntam se está tudo bem e o que ele quer.
Informou, ainda, que, regularmente, uma enfermeira vai até a sua cela para aferir a sua pressão (que estava alta na última aferição) e a sua glicemia, que também estava preocupantemente baixa, segundo relatou o interno.
O senhor Wellington Macedo de Souza relata que está preso desde o dia 03/09/2021 e que somente no dia 18/09/21 manteve contato com sua advogada por meio de uma videoconferência, bem como que, em nenhum momento, até a nossa visita, tinha mantido contato com alguém de fora do presídio. Relatou, também, que não entende o motivo da sua prisão, já que não apresenta risco nenhum à sociedade, além de não possuir nenhum tipo de arma.
Wellington disse que não vem se alimentando, muito embora o alimento seja regularmente providenciado pelo presídio, e que há mais de 10 dias ingeriu apenas 2 bananas. A água potável disponível é obtida da pia localizada na cela e, mesmo assim, afirmou que nos dois últimos dias não tem ingerido também o líquido.
Em relação à sua alimentação, o preso alternava momentos de lucidez e de devaneio. Em alguns momentos disse que não se alimentava porque não conseguia já que está muito abalado psicologicamente, em outros informou que não comia porque estava jejuando e somente se alimentaria quando saísse dessa condição e insistia em afirmar não saber o porquê da sua prisão.
II.III – Da Recomendação nº 62/2020, do Conselho Nacional de Justiça
É cediço que o país tem sido assolado pela pandemia do Covid-19, que atinge a todos os brasileiros, de maneira indistinta. O preso relatou que, já no presídio, foi vacinado contra a Covid 19.
Atento às condições excepcionais a que se submetem certa parcela mais vulnerável da população e, alinhado às recomendações da Organização Mundial de Saúde, o Conselho Nacional de Justiça avaliou as condições da população carcerária e efetivou medidas de proteção estampadas em suas Recomendações, as quais são norteadoras da atividade judicial e visam minimizar a exposição de pessoas à mencionada pandemia.
Destaque-se que o acautelado não teve contra si decisão condenatória transitada em julgado, não oferece perigo à integridade física das pessoas, tem residência fixa e está enquadrado nas condições estabelecidas pela Recomendação nº 62/2020, do Conselho Nacional de Justiça, a qual teve a sua validade prorrogada até o dia 31 de dezembro de 2021, da qual destacamos:
Art. 1º Recomendar aos Tribunais e magistrados a adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus – Covid-19 no âmbito dos estabelecimentos do sistema prisional e do sistema socioeducativo.
(...)
Art. 4º Recomendar aos magistrados com competência para a fase de conhecimento criminal que, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus, considerem as seguintes medidas:
I – a reavaliação das prisões provisórias, nos termos do art. 316, do Código de Processo Penal, priorizando-se:
(...).
c) prisões preventivas que tenham excedido o prazo de 90 (noventa) dias ou que estejam relacionadas a crimes praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa;
(...).
III – a máxima excepcionalidade de novas ordens de prisão preventiva, observado o protocolo das autoridades sanitárias.
Art. 5º Recomendar aos magistrados com competência sobre a execução penal que, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus, considerem as seguintes medidas:
III – concessão de prisão domiciliar em relação a todos as pessoas presas em cumprimento de pena em regime aberto e semiaberto, mediante condições a serem definidas pelo Juiz da execução;
III - DAS CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
Diante de todo o exposto, a Equipe do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos conclui que as condições gerais de encarceramento do senhor Wellington Macedo de Souza, são adequadas para garantia de sua dignidade enquanto pessoa humana privada de liberdade.
As condições prediais, as acomodações específicas e o tratamento humano se mostraram, naquele momento, satisfatórios, na medida do que é possível ao Estado.
O próprio custodiado testemunhou estar sendo bem tratado e sem reclamações.
No entanto, considerando a ausência de periculosidade do preso, os riscos de agravos em saúde remetem à extrema necessidade de atendimento especial, tudo com vistas à preservação da vida.
O custodiado Wellington Macedo de Souza se encontra visivelmente abalado psicologicamente, o que implica na sua dificuldade em se alimentar e, por conseguinte, debilidade física.
Assim, sem adentrar ao mérito das razões da prisão, os quais não conhecemos ou tivemos acesso, não se conseguiu vislumbrar a possibilidade de que o preso Wellington Macedo de Souza ofereça risco à sociedade ou a pessoa específica. Nesse sentido, não parece adequado seu regime de encarceramento.
Recomendamos, portanto, acompanhamento psicológico e de estado de saúde, preso em regime domiciliar, de forma a assegurar sua integridade e o exercício do pleno direito à saúde.
Atenciosamente,
Eduardo Miranda Freire de Melo
Secretário Nacional Adjunto de Proteção Global
Vandervaldo Gonçalves Lima
Ouvidor Nacional de Direitos Humanos-Substituto
Marco Vinicius Pereira de Carvalho
Membro do Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura
João André Alves Lança
Coordenador-geral de Combate à Tortura e Violência Institucional
Brasília, 24 de setembro de 2021.
Documento assinado eletronicamente por João André Alves Lança, Coordenador(a) Geral de Combate à Tortura e à Violência Institucional, em 27/09/2021, às 11:18, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no § 3º do art. 4º do Decreto nº 10.543, de 13 de novembro de 2020. |
Documento assinado eletronicamente por Vandervaldo Gonçalves Lima, Coordenador(a), em 27/09/2021, às 11:19, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no § 3º do art. 4º do Decreto nº 10.543, de 13 de novembro de 2020. |
Documento assinado eletronicamente por Eduardo Miranda Freire de Melo, Secretário(a) Adjunto da Secretaria Nacional Proteção Global, em 27/09/2021, às 11:28, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no § 3º do art. 4º do Decreto nº 10.543, de 13 de novembro de 2020. |
Documento assinado eletronicamente por Marco Vinicius Pereira de Carvalho, Assessor(a) Especial, em 27/09/2021, às 11:45, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no § 3º do art. 4º do Decreto nº 10.543, de 13 de novembro de 2020. |
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