Durante 27 dias, o submersível percorreu mais de 1.000 quilômetros sob a plataforma de gelo Dotson

Em uma missão histórica para explorar o coração da Antártida, o submarino autônomo Ran, com seis metros de comprimento, foi lançado em 2020 com o objetivo de investigar a enigmática ‘Geleira do Juízo Final’. Equipado com tecnologia avançada e um sistema de sonar sofisticado, Ran enfrentou os desafios de um dos ambientes mais inóspitos do planeta. Durante 27 dias, o submersível percorreu mais de 1.000 quilômetros sob a plataforma de gelo Dotson, na costa remota da Antártica Ocidental, mergulhando 17 quilômetros dentro da cavidade glacial.

O submarino, operado pela Universidade de Gotemburgo, conseguiu mapear em alta resolução a parte inferior da plataforma de gelo, revelando uma paisagem subglacial surpreendentemente complexa. Picos, vales e formações que lembram dunas de areia foram descobertos, provavelmente moldados por fluxos de água influenciados pela rotação da Terra. “É um pouco como ver o lado escuro da Lua”, disse Anna Wåhlin, principal autora do estudo e professora de física oceanográfica, destacando a singularidade das descobertas.

Os dados obtidos por Ran também indicaram que o glaciar Dotson está derretendo mais rapidamente em áreas onde as correntes subaquáticas erodem sua base, com derretimento acelerado em fraturas verticais que atravessam o glaciar. Esse fenômeno alarmante reflete o impacto das águas profundas circumpolares, uma mistura das correntes do Pacífico e do Oceano Índico, que afetam de forma desigual as diferentes partes da plataforma de gelo. Segundo Wåhlin, “embora tenhamos obtido dados valiosos, não conseguimos alcançar tudo o que esperávamos”.

A missão de Ran revelou não só o derretimento acelerado da geleira, mas também o papel crucial que as plataformas de gelo desempenham na estabilidade dos glaciares, atuando como barreiras que retardam o fluxo de gelo em direção ao mar. A desintegração dessas estruturas pode acelerar significativamente a subida global do nível do mar, uma preocupação crescente em um mundo afetado pelas mudanças climáticas.

Apesar dos avanços científicos proporcionados por Ran, o submarino perdeu sinal após suas descobertas. A equipe de pesquisa, porém, permanece otimista. Wåhlin garantiu que há planos para retornar com outro submarino, com a esperança de concluir o estudo e desvendar mais segredos ocultos sob o gelo da Antártida. A exploração de Ran, embora incompleta, já oferece uma visão inquietante sobre o futuro das geleiras e as implicações globais do aquecimento do planeta.